Do litoral ao Sertão, em Pernambuco falta água. Quanto a isso, não há nenhuma novidade para a população, mas a confirmação de que a situação degradante não melhora, mesmo diante das fortes chuvas que caem sobre o Estado. Os mananciais da Região Metropolitana do Recife e da Zona da Mata foram abastecidos com as chuvas nos últimos dias e, com isso, a Compesa promete melhorar o abastecimento. O desafio é enorme.
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No Estado, de acordo com o Diagnóstico Temático Serviços de Água e Esgoto do governo federal, sobrevive-se com menos do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a garantia do mínimo de dignidade, ou seja, falta água para beber, tomar banho, lavar roupas e louça. Falta água para sobreviver. E isso compromete a saúde e bem-estar da população, colocando o Estado como o segundo pior do País no quesito.
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Segundo a Compesa, as barragens que mais acumularam água, de acordo com o boletim emitido até as 14h20 desta segunda-feira, foram Botafogo (em Igarassu): 76,81%; Goitá (em Paudalho): 72,01%; Tapacurá (em São Lourenço): 69,02%; Cursaí (em Paudalho): 115,33%; Várzea do Una (em São Lourenço): 100%; Siriji (em Vicência): 112,37% e Tiúma (em Timbaúba): 95,19%. A chuva deve amenizar os racionamentos no Grande Recife, mas remediam apenas em parte um grande problema.
É comum o retrato no imaginário coletivo de um Nordeste seco, de terra batida, onde cada gota de água é celebrada pelos moradores. Em parte, a situação é respaldada no fator climático da região, mas não é justificativa suficiente já que, com conhecimento histórico da indisponibilidade hídrica, soluções capazes de mitigar ao máximo o problema ainda não tenham surtido o efeito esperado.
Engana-se quem acha que a falta de água é um problema das regiões mais remotas de Pernambuco. No bairro de Nova Descoberta, Zona Norte do Recife, Deyse Santos, 29 anos, já perdeu as contas de quantas vezes, rotineiramente, ficou sem água nas torneiras, mesmo em momento como agora - período de chuvas.
“É muito ruim acordar e não ter água. Na verdade, nem dorme, porque fica esperando chegar um pingo de madrugada. Os meninos quando chegam da escola, em vez de ir estudar, brincar, têm de ajudar a encher tonel. Para ir para a escola, toma banho como dá e escova os dentes do lado de fora, com uma vasilha, porque aua não chega. E o que a gente vê na televisão é pedidos para economizar água, mas a gente nem tem o que economizar”, desabafa.
- CONSUMO DE ÁGUA PER CAPITA NO NORDESTE: 120,3 L/hab/dia
- Pernambuco: 103,5 L/hab/dia
- Alagoas: 153,3 L/hab/dia
- Bahia: 115,7 L/hab/dia
- Ceará: 136,5 L/hab/dia
- Maranhão: 141,2 L/hab/dia
- Paraíba: 102,4 L/hab/dia
- Piauí: 128,6 L/hab/dia
- Rio Grande do Norte:109,3 L/hab/dia
- Sergipe: 124,0 L/hab/dia
Apesar de uma Parceria Público-Privada (PPP) que se arrasta há quase uma década na Região Metropolitana e os ciclos de investimentos dos governos estadual e federal em sistemas adutores no interior do Estado, a secura nas torneiras está longe do fim.
Recife é uma das capitais do País que não possui acesso universalizado à água na sua área urbana, apesar dos indicadores ultrapassarem os 90%, de acordo com o diagnóstico. Mas, mesmo tendo o sistema de abastecimento, a água, que é o fundamental, não chega.
Pernambuco é um dos três estados brasileiros com o menor consumo médio per capita de água do Brasil, segundo os dados de 2020 coletados pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, divulgados na terça-feira (24). Enquanto no País, o consumo médio per capita chegou a 152,1 litros diários por habitante. No estado, o consumo é de 103,5 L/hab/dia - o que representa alta de 2,17% em relação ao ano de 2019 -, mas ainda está atrás do mínimo estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (110 L/hab./dia) e do consumo médio no Nordeste, onde demais estados também possuem regiões semiáridas: 120,3 L/hab/dia. O consumo aqui só não é menor do que na Paraíba (102,4 L/hab/dia).
Sem acesso à água tratada, compromete-se as atividades básicas de higiene, que podem refletir no ocasionamento de doenças, assim como o preparo irregular de alimentos e o próprio uso de água considerada imprópria ao consumo humano.
Contrastantemente, enquanto os pernambucanos ainda vivem a penúria da falta de acesso à água, a Compesa, responsável pela rede de abastecimento estadual, tem perdas acima do nível nacional na distribuição.
Em 2020, o Índice de perdas na distribuição no Brasil bateu os 40,1% (seja por não ter sido faturado, por vazamentos, falhas nos sistemas de medição ou ligações clandestinas). No Nordeste, o percentual sobe para 46,3%. Pernambuco, especificamente a Compesa, o nível de perdas de 49,8% (9º maior percentual de perdas do País e terceiro da região Nordeste). Levando-se em conta o Índice de perdas por ligação, que também é apresentado no estudo, o Estado tem média de 343,3 l/lig./dia perdidos (índice mais próxima à média nacional).
A Compesa diz que as ligações clandestinas são um dos grandes vilões no combate ao desperdício de água, justificando que grande parte das perdas da companhia é referente a um volume que foi consumido, mas que não foi aferido em decorrência de furtos de água. “Nesse sentido, a Compesa está atuando de forma efetiva junto à polícia e com ações de fiscalização para identificação e coerção das fraudes. Além disso, está adotando estratégias corporativas que focam na eficiência operacional dos sistemas de distribuição de água que auxiliarão a Companhia a chegar ao patamar de 25% de perdas na distribuição, conforme meta estabelecida pela Lei 14.026”, assegura em nota.
Para além das perdas, a companhia reconhece que, apesar de “trezentas obras de abastecimento e esgotamento sanitário em andamento em todas as regiões e, para 2022, já dentro da previsão de investimentos para cumprimento da meta inicial do marco regulatório, serem aplicados R$ 1,3 bilhão”, o Estado ainda tem um grande desafio em relação ao fornecimento regular de água.
“Pernambuco é um dos estados com grandes desafios no que diz respeito à disponibilidade hídrica, o que interfere, por conseguinte, no consumo per capita da população, tornando-se inferior ao recomendado pela OMS. O contraste de Pernambuco em relação aos demais estados se evidencia ao analisar a predominância do clima tropical semiárido, caracterizado por elevadas temperaturas, chuvas escassas e rios perenes, passando por longos períodos de baixa disponibilidade hídrica em grande parte da região”, aponta a companhia.
O problema é que para pessoas como Deyse, a falta de água não é algo que acontece de agora, assim como o conhecimento da indisponibilidade hídrica no território estadual. “A gente reclama, mas sempre ouve a mesma coisa. Espera, mas nunca melhora”.
Nesta segunda-feira, a Compesa informou que, no interior do Estado, a distribuição de água foi retomada nos municípios de São Joaquim do Monte, Agrestina, Garanhuns, Macaparana, São Vicente Férrer, Timbaúba (parcial), Vitória de Santo Antão (menos o distrito de Pirituba), Rio Formoso, Tamandaré, Primavera, Sirinhaém, Pombos, Barra de Guabiraba, Belém de Maria, Sairé, São Bendito do Sul, Panelas, São Joaquim do Monte e Bonito.
Em Olinda, a distribuição voltou para Jardim Brasil, Rio Doce, Jardim Atlântico, Ouro Preto, Bairro Novo, Casa Caiada, Passarinho, Caixa D’água, Alto Sol Nascente, Águas Compridas, Alto da Bondade, Aguazinha e Jardim Fragoso (parte).
No Recife, o abastecimento foi restabelecido em Água Fria, Bola na Rede, Brejo da Guabiraba (parcialmente), Córrego do Jenipapo, Macaxeira, Dois Irmãos, Vila Dois Irmãos, Apipucos, Brejo de Beberibe, Dois Unidos, Passarinho, Alto José Bonifácio, Alto do Pascoal, Alto Santa Terezinha, Alto do Deodato, Beberibe, Linha do Tiro, Água Fria, Bomba do Hemetério e Alto da Brasileira.
Em Paulista, a água já voltou para Arthur Lundgren, Vila Torres Galvão, Janga e Pau Amarelo. Na Ilha de Itamarcá foi retomada a distribuição para Baixa Verde e Vila Eldorado. Em Goiana o abastecimento voltou, menos para o centro da cidade. Já Moreno voltou a ser totalmente abastecido e em São Lourenço da Mata a água voltou para Matriz da Luz. Em Camaragibe a distribuição de água voltou para Cosme Damião e Centro.