Quando desembarcou no Recife, Lula (PT) tinha dois objetivos a cumprir em Pernambuco para o segundo turno das eleições: encontrar uma maneira de ampliar sua alta votação no estado e alavancar a candidatura de Marília Arraes (SD) ao Governo.
A visita desta sexta-feira, 14 de outubro, foi marcada por uma caminhada com milhares de pessoas pelo centro da capital pernambucana e amarrou o apoio do PSB à candidata com repetidos agradecimentos a João Campos, a despeito da ausência de lideranças do partido também ser notada.
Nesse sentido, Lula e Marília Arraes investiram num discurso de frente ampla para lutar contra a reeleição de Jair Bolsonaro (PL). Essa bandeira foi o mote dos agradecimentos ao PSB, personalizado pela figura de João Campos.
O Prefeito do Recife, que derrotou a deputada federal na eleição de 2020 adotando um forte tom antipetista, foi elogiado pelo ex-presidente e pela sua prima pela escolha de apoiá-la no segundo turno.
O primeiro compromisso de Lula foi na Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares do estado de Pernambuco (Fetape), onde participou de uma coletiva de imprensa.
Na mesa, o petista foi ladeado por: Marília; pelo senador Humberto Costa (PT); João Campos; Sebastião Oliveira (Avante), vice na chapa de Arraes; e pela vice-governadora Luciana Santos (PCdoB). De lá, seguiram em caminhada com milhares de militantes, do Parque Treze de Maio ao Pátio do Carmo, na região central do Recife, onde foi realizado comício.
No seu pronunciamento, Lula emendou os elogios ao PSB à reclamação sobre Raquel Lyra (PSDB), que disputa o Governo de Pernambuco contra Marília Arraes.
A tucana adotou a neutralidade como posicionamento oficial sobre a disputa do petista contra Bolsonaro, num movimento que visa manter ao seu lado apoiadores bolsonaristas, como Miguel Coelho (UB). Anderson Ferreira (PL), candidato derrotado e apoiado oficialmente pelo presidente, ainda não se posicionou sobre o segundo turno.
"Foi uma atitude honesta, coerente e corajosa do PSB em Pernambuco. Ninguém esconde que haviam divergências profundas. Juntem os divergentes para vencer os antagônicos, é isso que foi feito aqui. Não conheço a adversária da Marília, não posso falar uma vírgula dela. Mas todas as pessoas ligadas a Bolsonaro foram apoiá-la. O PSB tomou a decisão correta, você pode ter uma briga, mas a relação é sanguínea", disse Lula na coletiva de imprensa.
Ele ainda classificou a candidatura de Marília como 'corajosa' e afirmou que devem se juntar à aliada todos que quiserem manter o estado governado democraticamente, juntando setores de esquerda pra uma boa administração... "Estou aqui porque preciso que ela ganhe e porque ela precisa que eu ganhe", completou o ex-presidente.
Nesse sentido, o petista apostou no mesmo discurso adotado por Danilo Cabral no primeiro turno. O candidato do PSB ao Governo afirmou que, se eleito, poderia promover a Pernambuco um "retorno aos bons tempos" da parceria Lula-Eduardo, referindo-se ao ex-governador morto num acidente de avião, em 2014. Agora, o ex-presidente usa o mesmo argumento para defender Marília.
O candidato, durante o primeiro turno, disputou com Marília a associação à imagem de Lula. Agora, o partido comandado por Sileno Guedes em Pernambuco se divide: a cabeça está com Arraes, enquanto parte da estrutura do PSB segue com Raquel. No comício, uma fala do ex-presidente chamou atenção com relação ao apoio dado ao socialista até o dia dois de outubro.
"Querida companheira Marília, eu acho que Deus de vez em quando brinca com a gente. Era pra eu ter ganho no primeiro turno, mas acho que ele falou: 'vamos ver se a Marília vai ganhar em Pernambuco. Espere ela pra vocês irem juntos fazer campanha, o dia que você ganhar, é dia que Marília vai ganhar em Pernambuco", disse Lula.
A candidata não comentou sobre o primeiro turno e seguiu o mesmo tom de "frente ampla". Afirmou tratar-se de um dia histórico e citou a aliança como uma oportunidade de unir as forças democráticas e quem representa projetos progressistas. "Passando por cima de divergências, colocando como foco maior reconstruir o Brasil e retomar o crescimento de Pernambuco. Por isso, neste primeiro ato, disputamos contra o fascismo, o ódio e a intolerância. Vamos e isolar o fascismo e colocá-lo no lixo da história do Brasil.
No comício, a candidata do Solidariedade foi além e direcionou críticas a Raquel, sem citá-la. Assim como na coletiva, fez agradecimentos a João Campos e a Humberto Costa, seu antigo rival interno no PT. Ela disse que a união se dá em torno de Lula, para derrotar o fascismo, a fome e o atraso.
"É uma irresponsabilidade sem tamanho dizer que tanto faz, irresponsabilidade histórica com o Brasil e com o povo mais pobre. (...) Estamos unindo Pernambuco e isolando o ódio. As forças mais conservadoras estão tentando dizer que 'tanto faz qualquer presidente'. Aqui a gente diz 'não, nosso presidente é Lula'", pontuou.
As críticas a Bolsonaro começaram ainda no discurso de Humberto Costa, que abriu o comício na Praça do Carmo após a caminhada. O senador, que foi elogiado pelo ex-presidente pela sua atuação enquanto ministro da Saúde durante o Governo do PT, também promoveu a ideia de "volta ao passado", mas apontou a artilharia contra o atual presidente.
"Marília vai fazer com Lula o que ele já fez no passado, trazendo melhoria e dignidade", comentou Humberto. O senador disse que Bolsonaro pegou carona no crescimento promovido pelo ex-presidente petista, mas afirmou que o povo nordestino não é burro. "Você vai levar uma lapada em Pernambuco e no Nordeste! Aqui em Pernambuco nós não vamos perder pra basculho", bradou o parlamentar, referindo-se à famosa frase do ex-BBB e economista Gil do Vigor.
"Quem tiver uma gota de sangue nordestino, não pode votar no Bolsonaro. Ele tem que aprender a respeitar as mulheres, o povo nordestino e a história. Este estado, em 1817, já fez uma revolução. Ele precisa aprender, os nordestinos passaram o problema da seca e da fome por muito tempo... Esse tempo vai acabar", disse o petista. O ex-presidente também afirmou que, para a região, é questão de honra votar contra o atual presidente após o mandatário associar analfabetismo no Nordeste ao voto lulista.
Lula deu orientações aos eleitores, no sentido de não promover ou aceitarem eventuais provocações de bolsonaristas. O candidato aproveitou para falar sobre violência contra as mulheres. "No meu governo, muitos ministros serão mulheres. Vamos ser muito duros no combate à violência contra as mulheres. Vamos começar fazendo a regulamentação da lei que concede a cada mulher o mesmo salário que o homem", garantiu.
O ex-presidente também prometeu a retomada do 'Minha casa minha vida', de investimentos na indústria naval, a conclusão e construção de novas refinarias para tornar o país ser autossuficiente na produção de combustíveis, além de novas políticas de crédito especial para o pequeno e médio empreendedor e estímulos à economia criativa. Lula também garantiu aumento real do salário mínimo anualmente.
Em Pernambuco, Lula recebeu 3.5 milhões de votos, o que representa 65,27% do total. Bolsonaro obteve 29,91%. Marília Arraes também terminou o primeiro turno em primeira na disputa pelo Governo, mas com vantagem menor. Ela ficou com 23,97% dos votos, enquanto Raquel teve 20,58%.