Reverbo reúne a cena autoral pernambucana no Santa Isabel

Sob direção de Juliano Hollanda
Bruno Albertim
Publicado em 20/01/2018 às 1:44
Sob direção de Juliano Hollanda Foto: Felipe Ribeiro / JC IMAGEM


Segundo o escritor e historiador bissexto da música brasileira Ruy Castro, em seu livro Chega de Saudade, uma funcionária do Grupo Universitário Hebraico do Brasil, sem saber como nominar aquele concerto de 1959 que reuniria nomes como Sylvinha Telles, Carlinhos Lyra e, entre outros, Nara Leão, escreveu na tabuleta algo como: “Hoje, um show bossa nova”. Casuisticamente, ao incorporar a gíria da época sobre novos comportamentos garbosos, o show acabou por classificar a música daquela geração que uniria de vez, com lirismo, o samba ao jazz. É bem possível que, uns anos mais pra frente, a atual geração de músicos autores de Pernambuco seja reconhecida como Geração Reverbo.

Reverbo é o nome do show, uma mostra da música contemporânea e autoral de Pernambuco, que tem sua segunda edição, hoje (20h), no Teatro de Santa Izabel. Depois de uma bem comentada edição ano passado, no Hermilo Borba Filho, o elenco de artistas cresce de dez para dezesseis intérpretes. “Reverbo não é um movimento, mas uma movimentação”, diz o músico Juliano Hollanda, idealizador do projeto e espécie de motor aglutinador dos novos nomes dessa cena em que, mais que em outros momentos, a palavra cantada ganha primeiro plano. “Além da amizade, o que nos une é a poesia”, sintetiza a cantora Mayra Clara, uma entre os novos reverberantes.

De repertório absolutamente autoral, extrato de trajetórias individuais estimuladas pela convivência poética com outros criadores, a performance coletiva de hoje conta com nomes mais ou menos já conhecidos do público de música local. Em números solos e, sobretudo, duetos, sobem ao palco: Almério, Juliano Holanda, Tonfil, PC Silva, Marcello Rangel, Vinicius Barros, Isadora Melo, Flaira Ferro, Isabela Moraes, Gabi da Pele Preta, Vertin Moura, Alexandre Revoredo, Agda Moura, Helton Moura, Mayra Clara e Jr. Black.

Atores do que se pode considerar a primeira grande geração musical com contornos definidos depois do mangue beat, eles deixam de lado o corolário de guitarras e alfaias misturadas na lama metafórica do Recife para investir na lírica das próprias canções. Instrumentos como cenário, e não na linha de frente, têm na palavra cantada, e muitas vezes recitada, a potência do cancioneiro. Outro ponto de confluência é a justamente a capacidade de aglutinação de Juliano Holanda, produtor de discos das novas safras como os últimos de Isadora Melo e Almério. “Juliano nem gosta desse termo, mas ele é, para gente, um mestre”, sintetiza Almério.

É uma geração que não se preocupa em se definir. “Não queremos ser um movimento. Não nos preocupamos em ter um nome coletivo. A gente deixa isso para os outros definirem”, diz o sertanejo, de Serra Talhada, PC Silva. Essa, aliás, é uma cena em que vários nomes do Estado se reúnem no Recife. Em cena, no show, PC terça vozes com Mayra na interpretação da afetiva canção Ímã. “Mayra é uma cantora que entra nas canções como poucas intérpretes”, diz ele, sobre a parceira que escolheu a canção para batizar seu primeiro EP.

Em comum, eles trazem a contundência de poetizar sentimentos, origens e lugares que se confundem com a própria subjetividade. “Seremos sempre o lugar de onde viemos, o rio, a terra, a lama, isso sai inevitavelmente na voz”, diz o também artista plástico Tonfil, poeta e compositor de São José do Egito, que, no disco que se prepara para gravar este ano, une o pop lírico da MPC (música pernambucana pernabucana) à larga poética sertaneja do Pajeú. No show, entre outros números, Tonfil dueta com a cantora Isadora Melo em Sibita Baleada, canção de Anaíra Mahin.

ÁGUA

Quem faz o violão com eles é Alexandre Revoredo, músico, compositor e poeta de Garanhuns que vem juntando os compositores do Agreste num espaço por ele criado, o Coletivo Teart. Ele terça vozes com a jovem musa Gabi da Pele Preta, cantora de Caruaru de talento talhado nos corais de igreja durante a infância e que, ao vivo, canta com a passsionalidade do soul. “Tumbeiros é uma canção que fala sobre resistência”, diz ela, sobre a canção a respeito da diáspora negra no Brasil.

Vinícius Barros, outro compositor, comparece com uma canção síntese sobre o Recife cidade anfíbia, “1975”. “Nesta cidade, tudo é ou já foi, ou tem cheiro de água”, diz o refrão. O Reverbo, enfim, metaboliza poéticas várias de uma cidade de vozes mais limpas que suas águas.

Reverbo. Teatro de Santa Izabel. 20h. R$ 40 e R$ 20 (meia)

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