Dentre os gastos milionários que o governo do Estado realizou até agora em ações de enfrentamento à covid-19, há uma parcela pequena, porém siginificativa, que foi reservada para compra de cloroquina, o polêmico medicamento que vem sendo desaconselhado por estudos científicos. Dos R$ 150,2 milhões liberados até maio no combate ao coronavírus para a área de saúde, R$ 100 mil foram gastos na compra do remédio em abril.
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Segundo dados da Secretaria da Fazenda sobre os desembolsos do Fundo Estadual de Saúde (FES), não há novas previsões de compra da cloroquina até o final do ano.
Em entrevista à Rádio Jornal na segunda-feira (18), o secretário da Saúde de Pernambuco, André Longo, criticou as "fake news" em torno do medicamento e disse Pernambuco recebeu 180 mil comprimidos da substância, e mais de 140 mil foram distribuídos em 63 unidades de saúde. "O Ministério da Saúde que não entregou medicação suficiente para fazer em casos leves", disse. Ele criticou a postura do governo federal que quer mudar os procedimentos do uso da droga nos hospitais ligados ao Sistema Único de Saúde (SUS). "Daqui a pouco vai ter uma medida estabelecendo cloroquina pra todo mundo. Não se faz prescrição médica por decreto, nem por medida provisória. A prescrição é uma prerrogativa do médico".
No total, o governo do Estado já gastou R$ 167,6 milhões no combate à covid-19 no Estado. A principal despesa, R$ 87,8 milhões, foi empenhada na compra de respiradores e outros equipamentos de UTI. Em seguida, vem gasto de R$ 34,9 milhões para compra de leitos e equipamentos para os hospitais Alpha, Brittes, Nossa Senhora das Graças e outros.
Máscaras, luvas, aventais, toucas, sapatilhas e outros equipamentos para os profissionais de sáude já consumiram, até maio, R$ 27,4 milhões, segundo os dados divulgados pela Secretaria da Fazenda.
Fora da área da saúde, a principal despesa é com o cartão de merenda escolar, da Educação, que já consumiu R$ 14,9 milhões.
Na área social, com recursos vindos do Fundo Estadual de Assistência Social (Feas), o governo já empregou R$ 1,4 milhão na combra de cestas básicas.
A Secretaria de Defesa Social (SDS) liberou outro R$ 1,1 milhão par compra de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para o pessoal da segurança, enquanto o Gabinete de Projetos Estratégicos (Gape) já utilizou R$ 100 mil para compra de equipamentos de transporte, assim como a Assessoria Especial do governo também aplicou R$ 100 mil em ações de apoio logístico.
A cloroquina vem sendo defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como principal bandeira de seu governo no combate à pandemia, apesar de estudos científicos apontarem para a baixa eficácia da cloroquina na cura de pacientes infectados e do alto grau de efeitos colaterais para quem passa a tomá-la. A droga é originariamente usada para tratamentos de doenças como lúpus e malária.
A aplicação de remédios à base de cloroquina para pacientes com sintomas iniciais da covid-19 foi, seria, inclusive, o motivo principal para a saída do ex-ministro Nelson Teich da Saúde. O presidente defende um uso amplo da substância. O médico propôs um estudo profundo no ministério sobre os efeitos, mas foi cobrado sobre uma definição com urgência.
A ampliação do uso da cloroquina para pacientes com quadro leve do novo coronavírus, poderia elevar a pressão por vagas em centros de terapia intensiva (UTI) e provocar mortes em casa por arritmia, alertou outro ex-ministro de Saúde do governo Bolsonaro, Luiz Henrique Mandetta.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele afirmou que resultados iniciais de estudos que recebeu quando ainda estava no governo já indicavam riscos no uso do medicamento.
"Começaram a testar pelos [quadros] graves que estão nos hospitais. Do que sei dos estudos que me informaram e não concluíram, 33% dos pacientes em hospital, monitorados com eletrocardiograma contínuo, tiveram que suspender o uso da cloroquina porque deu arritmia que poderia levar a parada [cardíaca]".
Outro presidente que é "garoto-propaganda" do medicamento é o americano, Donald Trump, que nesta segunda (18) voltou ao centro do noticiário por causa da hidroxicloroquina, medicamento que tem as mesmas aplicações da cloroquina. Ele disse que está tomando o remédio como forma de evitar ser infectado pelo vírus.
Trump sempre minimizou os riscos do novo coronavírus, inclusive na semana passada, quando disse que representa perigo apenas para um pequeno grupo de pessoas. Ele também se recusa a usar máscara, contrariando as recomendações de autoridades americanas e embora a maioria de sua equipe cubra os rostos em público.
Por outro lado, o presidente demonstra interesse em promover o uso da hidroxicloroquina, mesmo que vários médicos avaliem que não é eficaz para o tratamento do novo coronavírus e entidades reguladoras americanas alertarem que seu uso não é seguro.
O posicionamento pode ter uma motivação financeira, segundo uma reportagem do jornal The New York Times publicada no início de abril. Segundo o jornal, Trump tem uma pequena participação acionária na Sanofi, empresa francesa que é uma das maiores fabricantes do remédio. Um grande doador do Partido Republicano, Ken Fisher, segundo o New York Times, tem uma empresa que é uma das principais acionistas da Sanofi.