Se para o ex-presidente Lula não caberia ao PT fazer a autocrítica, para o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, seu braço direito, há espaço sim para reconhecer os erros do partido nos últimos anos. Durante o lançamento do livro “José Dirceu: Memórias Volume 1”, nesta terça-feira (10), na sede da Fetape, Dirceu afirmou que é preciso fortalecer a base social que o Partido dos Trabalhadores possui e trazer o povo de volta.
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“Nós erramos quando não estamos onde o povo está. Lógico que lutamos e fizemos um governo que nos dá essa base social e eleitoral, mas que se perde. Nós estamos a cada dois anos de uma eleição, temos que ter uma estrutura de luta política social”, declarou o petista.
“O que faltou para nós, foi o povo, para impedir o impeachment da ex-presidente Dilma (Rousseff) e a prisão do Lula”, cravou. Bastante aplaudido pelos militantes e lideranças presentes no evento, o ex-ministro defendeu a unidade do campo da esquerda para combater o chamado “bolsonarismo”, afirmando inclusive, que o presidente Jair Bolsonaro, conservador e de extrema direita, pode legalmente dar um golpe de estado. “Bolsonaro atua com luta política, cultural e ideológica, todo dia e toda semana. E com o fortalecimento da base eleitoral dele. Nós temos que correr atrás do prejuízo”, enfatizou.
Neste sentido, José Dirceu citou o uso das redes sociais feito pelo presidente Bolsonaro e sua base aliada. “Nós estamos apanhando de dez a zero das redes, e já são 12 anos. Não é um problema técnico, é um problema de decisão de prioridade e investir pesado. O retorno disse é extraordinário, mas para se ter uma ideia, nossos sindicatos não tem 10% de endereço eletrônico”, afirmou o ex-ministro, incentivando o uso das plataformas digitais para dialogar com as pessoas.
“Se tudo mudou, nós temos que mudar. Nós podemos ganhar as eleições de 2022, vai ser complicado, como sempre foi. Do que estamos com medo? O Lula tem 40% de votos, estamos no maior partido que já houve neste país com meio milhão de militantes, do que estamos com medo? Agora, temos que construir uma frente de esquerda unida”, pontuou.
O ex-ministro José Dirceu não poupou críticas à condução econômica e política do presidente Jair Bolsonaro. Ele chamou atenção para o momento vivenciado pela crise internacional com a guerra do petróleo entre a Rússia e Arábia Saudita, somado a epidemia do novo coronavírus, que fizeram a bolsas globais despencarem. “Todos os governos fazem planos emergenciais e adotam medidas para se anteciparem”,afirmou.
“O Brasil tem condições de enfrentar uma crise, como o Lula mostrou em 2008 e 2009. O certo agora, seria pegar R$ 100 bilhões das reservas e fazer um fundo para investir na infraestrutura, social e econômica, principalmente com habitação e saneamento. O que vemos é o Minha Casa e Minha Vida 1, que está desativado, e o saneamento básico tendo como solução a privatização”, declarou. No entanto, ele reconheceu que houve erros na administração da ex-presidente Dilma Rousseff, afirmando que a política econômica da petista confundiu a base social do PT.
Na sua passagem por Recife, o ex-ministro José Dirceu esteve reunido com lideranças do PSB e PCdoB. Após promovido pela vice-governadora de Pernambuco Luciana Santos com as lideranças comunistas, entre elas o vice-prefeito do Recife, Luciano Duque, e o deputado estadual João Paulo, Dirceu foi recebido a noite para um jantar no Palácio do Campo das Princesas, com o governador Paulo Câmara (PSB) e o prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB).
“Foi um jantar muito simples. Nós tivemos uma conversa informal de quem foi ministro e que tem uma história importante no País. Além disso, existe uma parceria com o PSB, então estivemos no Palácio para fazer uma visita”, explicou ao JC o presidente estadual do PT, o deputado estadual Doriel Barros, que esteve presente no encontro.
Ainda segundo o dirigente petista, o encontro foi articulado pelo próprio PT. “Fomos nós que pedimos para ver a possibilidade de Zé Dirceu ter uma conversa com as lideranças do PSB, da mesma maneira que estivemos com Luciana Santos, do PCdoB, e alguns companheiros”, disse Doriel.
Questionado se as eleições de 2020 fizeram parte do cardápio, o presidente estadual do PT, que defende a manutenção do partido na Frente Popular do Recife, disse apenas que o ex-ministro defendeu a unidade da esquerda. “Ele não opina em relação a isso, apenas faz uma fala de que acha que a esquerda precisa estar unida contra o projeto de desmandos de Bolsonaro. Ele comentou sobre a importância desse alinhamento no campo da esquerda, dos governadores do Nordeste. Os partidos precisam pensar que, neste momento, é necessário termos uma frente ampla e o PT, PSB, PDT e PCdoB são importantes para esta retomada”, destacou Barros.
O senador Humberto Costa, que também esteve presente no almoço realizado na vice-governadoria, também afirmou que não houve uma pauta específica. "Nós conversamos sobre o momento que o Brasil está vivendo hoje, como podemos interpretar essa situação. Não teve nenhum debate sobre a sucessão municipal", afirmou Costa. O vice-prefeito do Recife, Luciano Siqueira, disse que o ex-ministros mostrou ter o mesmo pensamento sobre a esquerda permanecer unida.
O ex-ministro da Casa Civil segue nesta quarta-feira (11) para o município de Garanhuns, e na quinta-feira (12) para Caruaru, para lançar seu livro.
José Dirceu foi acusado de ser o mentor do Mensalão, escândalo de compras de votos de pautas do Congresso Nacional, que veio a tona em 2005, durante o governo Lula (PT). À época, Dirceu era ministro da Casa Civil do ex-presidente e tido como o braço-direito de Lula. Dirceu foi condenado, em 2012, a 7 anos e 11 meses de prisão, e passou a cumprir pena em novembro de 2013. Mas em outubro de 2016, teve sua condenação perdoada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), graças a um indulto natalino.
Embora tenha sido beneficiado pelo indulto, José Dirceu não deixou a prisão, pois também cumpria pena por outra condenação, agora no âmbito da Operação Lava Jato. Ele é acusado de receber propina de fornecedores da Petrobras e foi condenado pelo ex-juiz federal Sergio Moro - atualmente ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro (sem partido). Por esse crime, sua pena é de 30 anos e 9 meses e 10 dias de prisão.
O ex-ministro da Casa Civil foi solto em novembro, após decisão da juíza federal substituta Ana Carolina Bartolamei Ramos, da 1ª Vara de Execuções Penais de Curitiba. De acordo com a magistrada, como os recursos de Dirceu ainda precisam ser analisados por outras instâncias deixou de existir "qualquer outro fundamento fático para o início do cumprimento de pena", visto que uma antiga decisão de prisão preventiva havia sido suspensa pelo STF em um habeas corpus apresentado pela defesa do petista.
José Dirceu foi detido em maio de 2019 após o Tribunal Federal da 4ª Região (TRF-4), o Tribunal da Lava Jato, impor condenação no processo que envolve o recebimento de propinas de R$ 7 milhões em contrato superfaturado da Petrobras com a empresa Apolo Tubulares, fornecedora de tubos para a estatal, entre os anos de 2009 e 2012.