Em meio ao debate jurídico gerado pela prisão do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) na noite da última terça-feira (16), o advogado Marcelo Labanca, professor de direito constitucional da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), diz acreditar que o parlamentar ultrapassou, sim, o limite democrático da sua liberdade de manifestação de pensamento. Nesta quarta (17), através de nota, a defesa de Silveira classificou a prisão como "um violento ataque" à liberdade de expressão, com evidente teor político.
O deputado foi preso por ordem do ministro Alexandre de Morais, do Supremo Tribunal Federal (STF), horas após publicar um vídeo proferindo várias ofensas contra magistrados da corte, defendendo o AI-5 e propagando a adoção de medidas antidemocráticas contra o Judiciário. Daniel Silveira já é alvo de dois inquéritos no STF.
"A democracia, para existir, precisa assegurar a liberdade de expressão de todos. Mas essa liberdade de expressão não pode se voltar contra os fundamentos, contra o coração, contra a existência da própria democracia. A democracia não permite elementos autofágicos. Eu não posso usar a minha liberdade de expressão para fazer apologia a crimes, por exemplo", pontua Labanca.
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De acordo com a decisão de Moraes, no vídeo divulgado pelo deputado, "durante 19 minutos e 9 segundos, além de atacar frontalmente os ministros do Supremo Tribunal Federal, por meio de diversas ameaças e ofensas à honra, (o parlamentar) expressamente propaga a adoção de medidas antidemocráticas contra o Supremo Tribunal Federal, defendendo o AI-5".
O ministro diz, ainda, que Silveira defendeu "a substituição imediata de todos os ministros (do STF)" e instigou "a adoção de medidas violentas contra a vida e segurança dos mesmos, em clara afronta aos princípios democráticos, republicanos e da separação de Poderes".
Marcelo Labanca explica que, por ser um deputado federal, Daniel Silveira possui o benefício da imunidade parlamentar e, por isso, só pode ser preso se cometer um crime inafiançável e em flagrante delito. No caso em questão, segundo o docente, havia duas possibilidades para o STF: processar o deputado pelo crime de injúria ou aplicar a Lei de Segurança Nacional, onde há previsão de crime inafiançável. Alexandre de Morais escolheu a segunda opção.
"A Lei de Segurança Nacional é da época da ditadura, uma legislação criada para punir aqueles que se voltavam contra aquele regime. Hoje, curiosamente, ela foi usada contra uma pessoa a favor da ditadura, que agiu contra o estado democrático de direito", observa o advogado.
Labanca faz questão de ressaltar, também, que a nossa Constituição prevê imunidade parlamentar aos legisladores para protegê-los de ataques políticos, não para garantir a impunidade no cometimento de crimes. "Antes da redemocratização o governo prendia e matava deputados. Quando a Constituição de 1988 veio, ela deu essa imunidade para que a prisão deixasse de ser um recurso político, não para gerar impunidade. Esse mecanismo deve ser usado para que o parlamentar possa exercer livremente o seu mandato, inclusive atuando contra o governo, sem medo de ser preso", frisa.
A ordem de prisão de Moraes é liminar e deve ser avaliada pelos demais ministros do STF ainda nesta quarta. A Câmara dos Deputados também deve analisar a prisão de Silveira, em plenário.