Houve um momento, no primeiro semestre de 2020, em que deputados de centro acreditavam que Bolsonaro não terminaria o governo.
Um parlamentar pernambucano, em conversa com esta coluna em maio daquele ano, fazia as contas: "o presidente mal tem 50 deputados em sua base. Se a coisa apertar ele não se segura".
A salvação do presidente foi se aliar ao centrão. Para isso, brigou com parte de seus apoiadores mais fiéis, inclusive muitos militares.
Um dos principais formuladores, no centrão, dessa salvação de Bolsonaro foi Ricardo Barros (PP-PR). Hoje líder do governo na Câmara, Barros foi o responsável pela articulação que colocou Arthur Lira (PP-AL) na presidência da Casa.
Barros, para quem não lembra, foi ministro da Saúde no governo de Michel Temer (MDB) e tem muitos contatos na área.
O colunista Fernando Castilho já apontava, há alguns dias, que o deputado e ex-ministro era o maior entusiasta das polêmicas vacinas Covaxin (indiana) e Sputnik V (russa). Mas, é importante lembrar que a intermediação do líder do governo não era apenas com as produtoras em seus países, mas, principalmente, com os laboratórios locais que iriam produzir o imunizante no Brasil.
Barros, inclusive, perdeu a linha ao dizer que iria "enquadrar" a Anvisa porque a agência não queria liberar as vacinas e chegou a usar seu poder na Câmara para aprovar um texto obrigando a Anvisa a liberar imunizantes em no máximo 5 dias. O texto caiu, depois.
O primeiro problema para Bolsonaro, decorrente do depoimento de hoje na CPI é grave. Pelo relato, o presidente prevaricou. É o crime que se comete quando se tem informação sobre uma irregularidade no serviço público e não faz nada para impedir. Mas, a consequência pode ser ainda mais dura se isso representar um rompimento de parte do centrão com o presidente.
Se entender que foi traído pelo presidente, que citou seu nome num esquema de corrupção para um parlamentar de baixo clero, Barros pode liberar Arthur Lira para aceitar, por exemplo, pedidos de impeachment contra o presidente.
Pior que isso, o centrão pode acabar fazendo o mesmo que fez com Dilma Rousseff entre 2015 e 2016, quando aprovava "pautas bomba" criando dificuldades.
Fazer Bolsonaro sangrar pode ser até pior do que derrubá-lo.
O nervosismo do presidente da República, que vem subindo o tom e atacando todos ao redor nos últimos dias, é visível. Ele sabe que a situação dele se complicou muito.