APOSTAS

Como surgiu o jogo do bicho? Uma das maiores loterias do mundo, prática pode ser legalizada no Brasil

A Câmara dos Deputados tenta votar um projeto que legaliza a prática, mas tem sofrido resistência de parte da oposição e das bancadas evangélica e católica, contrárias à proposta

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Marcelo Aprígio

Publicado em 16/12/2021 às 9:17 | Atualizado em 16/12/2021 às 11:44
ERA PROIBIDO Em 3 de outubro de 1941, o jogo do bicho passou a ser declarado como "prática ilegal" - 1º BPM/PMMT

Proibido por lei, mas presente em bancas localizadas em diversas esquinas do Brasil, inclusive ao lado do Supremo Tribunal Federal (STF), o jogo do bicho carrega um ar mítico em torno de si. Uma invenção genuinamente brasileira, esta não é uma prática atual, muito pelo contrário, é centenária e passada de geração para geração, sendo uma forma de unir entretenimento com possíveis ganhos. Certamente, qualquer brasileiro conhece, ao menos, um adepto da prática. Mas como surgiu o jogo do bicho, cuja legalização está em discussão no Congresso Nacional?

Tudo começou no dia 3 de julho de 1892, em um zoológico da Vila Isabel, Zona Norte do Rio de Janeiro. Na época, o barão João Batista de Drummond, na tentativa de atrair visitantes para o local, pensou em diversas ações de marketing até chegar à ideia de uma rifa, baseada na “Loteria das Flores”, idealizada por Manuel Ismael Zevada, um mexicano.



Desta maneira, Drummond passou a colocar a imagem dos bichos em uma caixa, e os ingressos da visitação tinham cada um a imagem de um animal, representando os 25 bichos que tinham no zoológico.

Ao final de cada dia, um sorteio ocorria retirando uma carta da caixa, e a pessoa que estivesse com o ingresso do mesmo animal ganhava. No primeiro sorteio, o animal premiado foi o avestruz.

Premiação alta

Vale frisar que a premiação era alta. À época, quem ganhasse o sorteio no dia recebia um valor até 20 vezes maior que o pago para a visitação ao zoo. Dessa forma, o Barão conseguiu salvar o estabelecimento com fundos para manter os animais, e ainda acabou atraindo a população, já que a premiação era bem vantajosa para a época.

O enorme sucesso da prática levou empresas da cidade a investirem no jogo, vendendo bilhetes com a possibilidade de escolher o animal, e o sorteio seguiu sendo organizado por Drummond. Com o passar do tempo, o jogo do bicho foi se espalhando e se adaptando pelo país, se tornando uma febre nacional, que dura até os dias atuais.

Assim, o jogo se tornou um negócio rentável e que gera empregos. Um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) estimou que o jogo do bicho tenha arrecadado de R$ 1,3 bilhão a R$ 2,8 bilhões no país em 2014 - número que alguns consideraram subestimado. Estima-se que, em todo o Brasil, o jogo do bicho empregue 450 mil pessoas, dessas 50 mil estão apenas na cidade do Rio de Janeiro, onde a prática nasceu.

Porém, pouco mais de 50 anos depois da criação de seu embrião, em 3 de outubro de 1941, o jogo do bicho passou a ser declarado como "prática ilegal" por força da Lei das Contravenções Penais.

Em 1946, o general Eurico Gaspar Dutra, então presidente, fechou os cassinos e proibiu a prática ou exploração de jogos de azar, em que concorre só a sorte do jogador, e não sua habilidade.

Discussão na Câmara

Portanto, mesmo com as adaptações e atualizações referente ao jogo, a modalidade segue sendo ilegal no país. Para tentar mudar isso, a Câmara dos Deputados tenta votar um projeto que legaliza jogos de azar, como o jogo do bicho, bingo e cassino, mas tem sofrido resistência de parte da oposição e das bancadas evangélica e católica, contrárias à proposta.

O projeto original, do deputado Renato Vianna (MDB-SC), é de 1991. O texto autoriza, entre outras coisas, a exploração de jogos de azar em todo o território nacional, "como instrumento de desenvolvimento social e econômico".

O relatório ficou a cargo do deputado Felipe Carreras (PSB-PE). Ele aproveitou partes do substitutivo aprovado em 2016 pela comissão especial que avaliou o mérito do texto.

A intenção do socialista é regulamentar a exploração de jogos de cassino, bingo, jogo do bicho, apostas de cota fixa, turfe (corrida de cavalo) e jogos de habilidade. Segundo ele, a ideia é criar um sistema nacional de jogos de aposta. "Estamos pegando exemplos de segurança, confiabilidade e de jogo responsável no mundo para blindar tentativa de uso do jogo para lavagem de dinheiro e pelo crime organizado", disse.

Carreras afirmou que será criado registro de jogadores para ajudar a identificar apostadores compulsivos. Nenhum jogador poderá participar de jogo ou aposta sem se cadastrar. "O jogo está acontecendo, sobretudo no ambiente virtual. O Brasil não arrecada nada, não está gerando emprego e é urgente que o Parlamento e o poder público criem ferramentas para gerar oportunidades e emprego para o povo", defendeu.

O mercado será regulado e supervisionado pela União, por meio de órgão regulador e supervisor federal a ser definido em lei própria. Além dessa entidade, fariam parte do sistema as operadoras de jogos e apostas, entidades turísticas, agentes de jogos e apostas, empresas de auditoria contábil e entidades de autorregulação do mercado de jogos e apostas registradas no órgão regulador e supervisor federal.

Carreras propõe que, além dos impostos já vigentes (ISS, PIS/Pasep e Cofins, Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre Lucro Líquido), seja aplicada a Cide-Jogos, com alíquota de 25% para os jogos online e de 20% para os demais. Haveria ainda uma taxa de fiscalização para emissão da licença e uma anual de renovação.

De acordo com o texto, seria criado um rol de "crimes contra o jogo e a aposta", para criminalizar a conduta de quem explora qualquer espécie de jogo, físico ou virtual, sem atender aos requisitos da regulação.

Também seria punido quem frauda o resultado do jogo ou aposta, permite que menor de 18 anos participe de jogos e quem realiza ou autoriza transações financeiras por meio de cartão de crédito, empréstimo ou outra espécie de financiamento com empresas ou sites estrangeiros na internet que explorem a atividade de jogos. Há ainda uma punição para quem dificulta a fiscalização. De modo geral, indica o texto, a pena seria de reclusão, que pode chegar a sete anos.

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