Quando o avião da Força Aérea Brasileira (FAB) decolou de Brasília rumo à Flórida (EUA), na manhã de 7 de março, o risco de contaminação pelo novo coronavírus não era uma preocupação do presidente Jair Bolsonaro e sua comitiva. Tanto que, nos quatro dias de compromissos no Estado americano, as medidas de prevenção já recomendadas por especialistas não foram adotadas nem pelo presidente nem por seus acompanhantes. Foi durante esta viagem que Bolsonaro declarou pela primeira vez que a pandemia estava "superdimensionada" e era uma "fantasia".
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Até sexta-feira (20), 22 pessoas que estiveram no grupo foram diagnosticadas com a covid-19. Levantamento feito pelo Estado mostra que pelo menos 45 brasileiros se encontraram com Bolsonaro nos EUA, viajando com ele no avião da FAB ou em voos comerciais. Na prática, os infectados já correspondem à metade do grupo. O descaso de Bolsonaro com a pandemia resultou em "panelaços" pelo País.
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Dois dias antes de ir para a Flórida, Bolsonaro havia cancelado viagem à Hungria e à Polônia, por causa do coronavírus. Na mesma data, o Brasil tinha oito casos confirmados, enquanto EUA estavam em plena ascensão da pandemia, com 157 confirmações e 11 mortes. No entanto, a hipótese de cancelar a viagem, que incluía um jantar com o presidente Donald Trump, nem foi cogitada.
O roteiro de Bolsonaro começou com o jantar em Mar-a-Lago, na Flórida, onde o brasileiro cumprimentou e teve contato com Trump e o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, além do alto escalão do governo americano. Na porta do resort na Flórida, Trump disse a repórteres que não estava "nem um pouco preocupado" com a notícia do primeiro contágio pelo vírus na capital americana, Washington. Mais cedo, os organizadores do Cpac, conferência conservadora, informaram a confirmação do coronavírus em um dos presentes no evento, onde estiveram Trump, seus filhos Ivanka e Donald Trump Jr., o genro, Jared Kushnero, e o secretário de Estado, Mike Pompeo. Ivanka e Kushner participaram do jantar com Bolsonaro.
Também em Mar-a-Lago, Trump voltou a minimizar a doença, afirmando que a disseminação do vírus não faria com que ele suspendesse a campanha eleitoral. Naquele dia, duas mortes pelo coronavírus haviam sido confirmadas na Flórida. Nove dias depois, já eram quase 5 mil casos confirmados nos EUA, e Trump passou a pedir que a população não saísse de casa. Até sexta eram 225 mortes e 17,5 mil casos no país.
No jantar, sentaram à mesa Trump, Bolsonaro e outras dez pessoas: cinco de cada país. Do lado do Brasil, dois dos cinco tiveram teste que confirmou o coronavírus: o embaixador Nestor Forster e o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. Do lado americano, a Casa Branca informou apenas que Trump foi submetido ao teste e não está infectado. O Estado perguntou duas vezes à Casa Branca se os demais presentes fizeram o exame, mas o governo americano não respondeu.
O local onde o jantar foi realizado teve diversos presentes, como o chefe da Secretaria de Comunicação, Fabio Wajngarten, o primeiro caso confirmado da comitiva brasileira, como antecipou o Estado. Ao ser informado de que Wajngarten estava infectado, Trump resistiu à ideia de fazer o exame. Depois, fez o teste, que deu negativo.
Nos outros três dias de viagem, a comitiva também não parecia preocupada em evitar contato com a população e aglomerações. Apenas por questão de segurança, Bolsonaro, às vezes acompanhado da primeira-dama Michelle, seguia em carro separado do restante da comitiva.
Wajngarten era companhia constante de Bolsonaro, ao lado dos ministros Heleno e Fernando Azevedo, da Defesa. O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que está infectado, chegava ao café da manhã do Hotel Hilton com roupas esportivas, depois de fazer exercício, e se juntava ao grupo.
A Justiça Federal do Distrito Federal determinou, na sexta, que o Hospital das Forças Armadas (HFA) informe imediatamente a lista de infectados por coronavírus que viajaram aos EUA na comitiva presidencial. A juíza Raquel Soares Chiarelli impôs multa de R$ 50 mil por paciente que tiver a informação sonegada.
O presidente Jair Bolsonaro disse, na sexta, que poderá fazer um terceiro exame e que pode até já ter contraído coronavírus. Há uma semana, o Estado pede que a Secretaria de Comunicação da Presidência mostre os resultados dos exames já feitos pelo presidente, mas não houve resposta até a publicação desta matéria.
Coronavírus é uma família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus foi descoberto em 31/12/19 após casos registrados na China.Os primeiros coronavírus humanos foram isolados pela primeira vez em 1937. No entanto, foi em 1965 que o vírus foi descrito como coronavírus, em decorrência do perfil na microscopia, parecendo uma coroa.
A maioria das pessoas se infecta com os coronavírus comuns ao longo da vida, sendo as crianças pequenas mais propensas a se infectarem com o tipo mais comum do vírus. Os coronavírus mais comuns que infectam humanos são o alpha coronavírus 229E e NL63 e beta coronavírus OC43, HKU1.
O Ministério da Saúde orienta cuidados básicos para reduzir o risco geral de contrair ou transmitir infecções respiratórias agudas, incluindo o coronavírus. Entre as medidas estão:
Para a realização de procedimentos que gerem aerossolização de secreções respiratórias como intubação, aspiração de vias aéreas ou indução de escarro, deverá ser utilizado precaução por aerossóis, com uso de máscara N95.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) disse na última quarta-feira (11) que a epidemia de Covid-19, que infectou mais de 110.000 pessoas em todo mundo desde o final de dezembro, pode ser considerada uma "pandemia", mas que pode ser "controlada".
"Estamos profundamente preocupados com os níveis alarmantes de propagação e de gravidade, bem como com os níveis alarmantes de inação" no mundo, declarou o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em entrevista coletiva em Genebra.
"Consideramos, então, que a Covid-19 pode ser caracterizada como uma pandemia", afirmou.