O contrato do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para a compra da vacina contra a covid-19 Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biontech, ganhou grande repercussão depois de ter se tornado alvo de investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado Federal e do Ministério Público Federal (MPF).
As supostas irregularidades na compra do imunizante foram denunciadas pelos irmãos Miranda, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, na CPI.
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A comissão passou a investigar por que o Governo Federal deixou de comprar doses no ano passado e resolveu adquirir vacinas neste ano com preços maiores. Documentos do Ministério das Relações Exteriores obtidos pelo Estadão mostram que o governo comprou a Covaxin por um preço 1.000% maior do que seis meses antes era anunciado pela própria fabricante.
Em depoimento prestado à CPI na última sexta-feira (25), o deputado Luis Miranda disse que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) atribuiu ao líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP), a responsabilidade por eventuais irregularidades no processo de compra do imunizante indiano.
Na oportunidade, Luis Miranda e o irmão, Luis Ricardo Miranda, servidor da Saúde responsável por liberar a importação dos insumos, foram recebidos por Bolsonaro para narrar ao chefe do Executivo o que detectaram como suspeito nas tratativas para importação da Covaxin.
Em fevereiro deste ano, Barros apresentou emenda à Medida Provisória 1.026/2021 para que a Anvisa liberasse imunizantes aprovados na Índia, ação que facilitava a entrada da Covaxin. A emenda incluiu a Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO), da Índia, na lista de agências habilitadas.
Histórico
Tudo começou com uma compra de 20 milhões de doses da Covaxin, por cerca de US$ 15 cada unidade, o equivalente a R$ 80,70, na cotação da época. No total, o negócio é de R$ 1,6 bilhão, mas o pagamento só seria feito após a Anvisa liberar o uso do produto, segundo a Saúde. Trata-se de valor superior ao de cada dose da vacina de Oxford/AstraZeneca, fabricada na Índia (US$ 5,25 por unidade), e os US$ 10 pagos pela Coronavac.
A compra teria sido executada antes mesmo de firmar contrato para compra de vacinas da Pfizer, que vinham sendo oferecidas ao Brasil desde 2020. Atualmente, a Covaxin é a vacina mais cara negociada pelo governo até agora.
Em março, a Anvisa rejeitou a solicitação do Ministério da Saúde para autorização excepcional e temporária para importação e distribuição da vacina indiana Covaxin (BBV152). Na época, a direção da Anvisa informou que os dados apresentados não cumpriram os requisitos de lei para atestar a qualidade e eficácia da vacina indiana.
A expectativa do ministério era de que 8 milhões de unidades desembarcassem no País ainda em março. No mês seguinte, o mesmo volume. Em maio, outras 4 milhões de doses. Na época, a Anvisa afirmou que os lotes já feitos desta vacina poderiam estar comprometidos, pois "não teriam a garantia de reprodutibilidade com os lotes clínicos e da segurança do produto".
O que pode acontecer
Com o que vem sendo apontado na CPI, e a depender da confirmação de que houve realmente ilegalidade na compra da Covaxin, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), membro titular da CPI da Covid, falou da possibilidade de abertura de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro.
Segundo afirmou o senador, a ação só poderia ser justificada em um “caso extremo” de corrupção, visto que o atual cenário do país não é propício.
“Qual seria o caso extremo? O caso extremo seria, por exemplo, que nessa história da Covaxin chegássemos à conclusão que havia interesses escusos atrás disso e não haja explicação para o assunto. Aí não tem jeito, porque simplesmente se negou à população brasileira uma vacina (a Pfizer) que teria salvo vidas e vidas em função de um interesse escuso (privilegiando a Covaxin)”, afirmou o senador em entrevista para a BBC News Brasil na quinta-feira (24).
A CPI da Covid ainda vai avaliar a quebra de sigilo fiscal e bancário da Precisa Medicamentos, intermediária entre o governo brasileiro a indiana Bharat Biotech, e a empresa Cingapura Madison Biotech, que também foi indicada no contrato para receber US$ 45 milhões adiantados do contrato de R$ 1,6 bilhão para aquisição de 20 milhões de doses.