Revogação da compra de galpão pela Prefeitura do Recife repercute entre parlamentares de oposição
Compra de galpão no Cabo e de instrumentos musicais pela Prefeitura do Recife são alvo de questionamento dos vereadores do Recife Alcides Cardoso (DEM) e Renato Antunes (PSC) e da deputada estadual Priscila Krause (DEM)
Atualizada às 19h41
A decisão da Prefeitura do Recife de revogar a compra, por meio de dispensa de licitação, de um galpão no município do Cabo de Santo Agostinho no valor de R$ 12,8 milhões repercutiu na sessão plenária da Câmara Municipal desta terça-feira (30). O vereador Alcides Cardoso (DEM) questionou o destino de 7 mil instrumentos musicais e 7 mil estantes de partitura condicionados no local.
A compra foi alvo de outros questionamentos por parte da deputada estadual Priscila Krause (DEM), de inquérito do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) e de representação interna pelo Ministério Público de Contas (MPCO). Além disso, o TCE já havia determinado que a PCR não seguisse com os pagamentos referentes a esse contrato.
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Alcides Cardoso chegou a fiscalizar o local onde os equipamentos se encontravam no galpão no mês de outubro. Segundo ele, os itens estavam encaixotados há cerca de 10 meses e alguns já estavam com mofo na capa. Antes, ele tinha ido até o almoxarifado da Secretaria de Educação do Recife, na Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, na busca por eles, mas foi impedido de entrar.
"A história não termina nos galpões que serão devolvidos porque eles trazem um outro grande problema para a prefeitura, que pude verificar em um deles em minha fiscalização no último dia 27 de outubro. Aí eu pergunto: Para onde irão os 14 mil instrumentos musicais também comprados a toque de caixa e sem licitação que estão estocados, sofrendo com a ação do tempo, em um desses galpões?", questionou o vereador.
“Nós verificamos e de pronto encaminhamos uma representação ao Ministério Público solicitando uma explicação para a compra desses imóveis, porque ficamos surpresos. A prática já tinha apontado que não era boa essa compra, visto que imóveis comprados anteriormente, em situação semelhante, já tinham indícios de superfaturamento”, afirmou.
O valor total pelos instrumentos corresponde a R$ 10,7 milhões, dos quais R$ 5,3 milhões já foram pagos pela administração municipal, mas eles estão sem uso.
"Os instrumentos serão transferidos para um outro local para continuarem empilhados? Na visita que fiz ao galpão que abriga os equipamentos, já me causou preocupação a deterioração a qual esse itens estão expostos. Imagine agora que não há um destino certo para os 14 mil instrumentos que possibilitariam a formação de 500 novas bandas escolares, sendo que a rede municipal de ensino tem apenas 19 professores de música para as atuais 12 bandas", afirmou o democrata.
Alcides se reuniu no início de novembro com a conselheira do TCE-PE, Teresa Dueire, para sugerir uma negociação dos equipamentos já pagos para outros estados e municípios ou outra alternativa, que seria de cessão temporária para entidades beneficentes que já promovem aulas de música para crianças em situação de vulnerabilidade social. Ele pediu também que os itens não pagos pela secretaria fossem devolvidos.
O líder da oposição na Câmara, Renato Antunes (PSC), chegou a parabenizar o prefeito João Campos pela decisão. "O prefeito demonstra que de fato mudou o CPF da Prefeitura do Recife ao tornar sem efeito essa compra abusiva, que foi denunciada, e ia trazer sérios prejuízos ao erário publico. Estou formulando um voto de aplauso pelo prefeito reconhecer por autotutela, que a compra feita pelo seu antecessor feria os bons costumes e os princípios da administração pública", afirmou o líder durante sessão desta terça (30).
Ele foi um dos que entrou com uma representação no MPPE solicitando informações sobre a compra. "A prática já tinha apontado que não era boa essa compra, visto que imóveis comprados anteriormente, em situação semelhante, já tinham indícios de superfaturamento”, afirmou.
O líder da bancada de governo na Câmara, Samuel Salazar (MDB) rebateu por meio de nota os questionamentos de Alcides Cardoso. "Mais uma vez estranha a insistência do vereador Alcides Cardoso (DEM) em tentar levantar suspeição sobre a aquisição de instrumentos musicais feito pela Secretaria de Educação do Recife, um assunto que está completamente esclarecido por parte da gestão municipal e órgãos de controle, a exemplo do Tribunal de Contas do Estado (TCE). No interesse de querer bater a meta de produtividade junto à deputada estadual Priscila Krause - a qual setores da sociedade a atribuem como sua chefe -, o nobre colega demonstra não ter uma pauta específica para fazer jus ao exercício da vereança", afirmou o governista.
Samuel reiterou o que já vinha sendo informado pela Secretaria de Educação a respeito da compra, como a destinação para "ampliar a utilização da arte e cultura enquanto ferramenta de inclusão e desenvolvimento de habilidade nas unidades escolares da Rede Municipal de Ensino do Recife" e formatação de um projeto de oficinas de musicalização nas escolas do Ensino Fundamental de Anos Finais da rede".
"Diante do exposto, convido ao colega vereador direcionar esforços a colaborar com os verdadeiros desafios do Recife, fazendo jus aos votos depositados por seus apoiadores num trabalho que resulte numa maior justiça social e uma cidade de oportunidades e de geração de emprego e renda, em especial para quem mais precisa. Afinal, fazer política espalhando fake news, de nada serve à população recifense. O povo espera mais", completou o vereador.
Histórico
A deputada estadual Priscila Krause (DEM) havia entrado com uma representação em julho deste ano junto ao Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE) e ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE) questionando a compra dos instrumentos.
Na época, o líder da bancada de governo na Câmara, Samuel Salazar (MDB), saiu em defesa da legalidade e da legitimidade da compra realizada pela prefeitura. "A Secretaria de Saúde do Recife fez a aquisição dos instrumentos e estantes de partituras através da adesão à Ata de Registro de Preços, processo regular previsto legalmente e que pode ser utilizado por qualquer órgão ou entidade da administração pública, obedecendo às condições da vigência da ata e da comprovação da vantajosidade da adesão, assegurando a lisura de todo o processo, tendo sido aprovado pelos órgãos de controle interno da Prefeitura do Recife".", disse.
O parlamentar informou que a aquisição dos instrumentos iria atender as atuais bandas e fanfarras da Rede Municipal de Ensino e também ampliar o número de grupos de 12 para 42, "contemplado escolas de anos finais e iniciais do ensino fundamental, além de servirem para muitas outras escolas da rede para oficinas de musicalização e projetos de teatro encenados", completou.
A empresa fornecedora dos instrumentos, Brink Mobil informou que venceu o procedimento licitatório "por ter apresentado o preço mais vantajoso durante a disputa de preços entre as nove (9) empresas competidoras". A diferença de preços para a segunda colocada, segundo a empresa, foi de R$ 1,4 milhão.
A Brink Mobil lamentou ainda ter recebido apenas 47,50% do valor contratado, apesar de ter feito a entrega de todos os instrumentos previstos. "Por último, ressaltamos que não há nenhuma irregularidade e nem impedimento da empresa BRINK MOBIL em continuar fornecendo recursos educacionais de excelência e contribuir com a melhoria da educação pública em todo o País", reiterou a empresa por meio de nota.
O Ministério Público de Contas de Pernambuco (MPCO), por sua vez, entrou com uma representação interna no TCE-PE pedindo a abertura de uma auditoria especial para apurar a compra. O órgão constatou indícios de irregularidades no que diz respeito à transparência do processo, como a falta de informações no Portal da Transparência e no portal Tome Conta, do próprio TCE-PE, onde constam aquisições realizadas por todas as prefeituras pernambucanas. Um exemplo foi o fato da licitação ter sido intermediada por uma entidade do interior do estado de Minas Gerais, por meio de uma prática chamada de "carona".
O MPCO também apontou que a empresa era alvo de denúncia em diversos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União e a Controladoria Geral da União (CGU). A Polícia Federal também investiga a empresa no âmbito da Operação Calvário, para apurar o seu envolvimento em um esquema de desvio de R$ 134,2 milhões de dinheiro público das áreas da saúde e da educação na Paraíba.
A Brink Mobil afirmou também, na nota, que atua "com conduta irrepreensível há mais de 34 anos no segmento fornecendo uma gama de produtos educacionais para órgãos públicos de todas as esferas".
Em 14 de julho, a Secretaria de Educação divulgou uma lista de 36 escolas que devem receber parte dos instrumentos. Além dos 42 grupos, serão beneficiadas oficinas de musicalização nesse universo da escolas de Anos Finais da Rede Municipal de Ensino "com benefício direto para 12.079 estudantes do 6º ao 9º anos, além de 6.558 alunos da EJA", disse a pasta por meio de nota.
No dia seguinte, 15 de julho, a PCR recebeu um pedido de informações do TCE a respeito da aquisição dos instrumentos. O pedido foi protocolado pela relatora dos gastos da educação do Recife no ano de 2021, a conselheira Terese Dueire.
O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) instaurou um Inquérito Civil (01998.000.909/2021) para apurar "sob a ótica da improbidade administrativa", possíveis irregularidades na aquisição. O órgão identificou a ausência de processo licitatório, a devida publicidade e a falta de razoabilidade do quantitativo de instrumentos musicais profissionais comprados.
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Galpão
A revogação da licitação para a compra do galpão da Secretaria de Saúde do Recife foi comemorada por Priscila Krause. Um dos questionamentos em torno da compra é o fato do local do novo almoxarifado estar muito distante das escolas do Recife e já existir um contrato de locação para outro imóvel com os mesmos fins no bairro da Muribeca, em Jaboatão, cujo contrato ainda está válido por mais cinco anos.
No galpão funcionaria o almoxarifado da Secretaria de Educação. O imóvel está situado na Av. Governador Miguel Arraes de Alencar, 1380, no Condomínio Logístico e de Armazenagem (CLAS), em Ponte dos Carvalhos.
A revogação do ato de dispensa de licitação nº 021/2020 foi publicada no Diário Oficial do Município no último sábado (27). Já o contrato foi publicado no dia 29 de dezembro de 2020, na gestão do então prefeito Geraldo Julio (PSB), antecessor de João Campos (PSB).
De acordo com a pasta, a revogação da licitação está fundamentada no artigo 49º da Lei Federal 8.666/93. A legislação diz que a autoridade competente só poderá revogar licitações por razões de interesse público "decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta".
Segundo argumentou Priscila, a decisão da gestão do prefeito João Campos (PSB) seria a prova do reconhecimento de que a aquisição, feita no final do governo de Geraldo Julio, foi inadequada.
"O ex-prefeito deixou uma série de pendências administrativas para o povo do Recife pagar e nós estamos levantando isso desde dezembro do ano passado. O galpão no Cabo é simbólico e finalmente aponta que a atual gestão concorda conosco de que se tratava de um gasto absurdo e suspeito. No final das contas, ganha o cidadão pagador de impostos, que deixará de bancar uma compra desnecessária, sem licitação, de quase treze milhões de reais", afirmou Priscila no seu Twitter.
Ela ressaltou o trabalho desempenhado pelos órgãos de controle no caso, após denúncias realizadas por ela. A conselheira Teresa Dueire determinou, em janeiro de 2021, a instauração de uma auditoria especial sobre o contrato e expediu alerta de responsabilização proibindo o repasse dos R$ 12,8 milhões para a empresa proprietária do imóvel, a Nova Terra Incorporadora e Construtora Ltda. Ela atendeu na íntegra denúncia do MPCO de suspeita de irregularidades envolvendo o contrato.
No início de setembro, a Segunda Câmara do TCE-PE decidiu manter a suspensão da compra. O acórdão da decisão apontou que a dispensa de licitação "não seguiu os ditames legais", não foi publicada no portal da Transparência e vai de encontro a determinação anterior do órgão para que os gestores evitassem gastos desnecessários diante da pandemia da covid-19. O órgão informou que uma auditoria interna apontou "indício de sobrepreço" de mais de R$ 4 milhões.
"O Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público de Contas tiveram papel fundamental nessa questão do galpão, que foi uma compra cujo termo de dispensa data de vinte e nove de dezembro do ano passado e que não havia qualquer justificativa para ter acontecido”, registrou.