Milhares de iraquianos, incluindo autoridades, participaram, neste sábado (4), em Bagdá, do funeral do general iraniano Qasem Soleimani, morto no Iraque em um ataque americano. "Morte à América", gritou a multidão em Bagdá e nas cidades sagradas xiitas de Kerbala e Najaf na passagem do cortejo fúnebre do general iraniano e de seu braço-direito iraquiano, Abu Mehdi Al Muhandis, mortos na sexta-feira (3) em um ataque com drone perto do aeroporto internacional de Bagdá.
Temendo represálias, a coalizão internacional anti-jihadista liderada pelos Estados Unidos reduziu suas operações e reforçou a segurança de suas bases no Iraque, segundo uma autoridade americana. Na véspera, os Estados Unidos anunciou o envio de entre 3.000 e 3.500 soldados adicionais para reforçar a segurança dos militares e diplomatas americanos no Iraque.
O assassinato de Soleimani - o arquiteto da política do Irã no Oriente Médio - e do líder miliciano Al Muhandis - número dois da coalizão paramilitar pró-iraniana Hashd Al Shaabi e considerado o homem do Irã em Bagdá - faz temer um novo conflito na região. O Irã prometeu "uma dura vingança no momento e no lugar apropriados".
Justificando o ataque, o presidente americano Donald Trump disse que eliminou Soleimani para parar uma guerra e não começar outra, e garantiu que o general planejava um ataque "iminente" contra os interesses dos Estados Unidos. ''Os Estados Unidos cometeram "um ato de guerra" contra o Irã'', considerou o embaixador iraniano na ONU, Majid Takht Ravanchi. "A resposta a uma ação militar é uma ação militar. Por quem, quando ou onde, o tempo dirá".
Segundo o vice-comandante da Guarda Revolucionária, o contra-almirante Ali Fadavi, os Estados Unidos disse ao Irã: "se você quiser se vingar, vingue-se proporcionalmente ao que fizemos". Os americanos não estão em posição de "decidir" a resposta do Irã e "devem esperar uma dura vingança", disse Fadavi, citado na televisão estatal.
O ministro das Relações Exteriores, Mohammed Javad Zarif, falou apenas de "uma mensagem ridícula dos americanos". E a Suíça, que representa os interesses dos Estados Unidos no Irã na ausência de relações diplomáticas entre os dois países, confirmou que seu representante transmitiu uma mensagem dos Estados Unidos, sem especificar seu conteúdo. Os apelos à vingança foram retomados no Iraque neste sábado.
Os corpos das dez vítimas foram levados de Kazimiya para a chamada Zona Verde, um bairro sob rigorosas medidas de segurança e sede de instituições governamentais e de várias embaixadas, incluindo a dos Estados Unidos, que na terça-feira sofreu um ataque de apoiadores da Hashd.
O primeiro-ministro iraquiano Adel Abdel Mahdi participou do funeral, assim como Hadi Al Ameri, chefe das forças pró-iranianas no parlamento iraquiano, o ex-primeiro-ministro Nuri Al Maliki e vários chefes de facções xiitas pró-iranianas.
Após o funeral, os corpos serão transferidos para Kerbala e Najaf, duas cidades sagradas xiitas ao sul da capital. Al Mouhandis será enterrado no Iraque e o corpo de Soleimani será transferido para o Irã, onde será sepultado na terça-feira, em sua cidade natal, Kerman (centro).
Na terça-feira passada, durante o funeral de 25 combatentes de uma milícia Hashd, a multidão atacou o primeiro perímetro da embaixada dos Estados Unidos com barras de ferro. Os analistas agora temem um conflito entre o Irã e os Estados Unidos em solo iraquiano. No Irã, as autoridades decretaram três dias de luto oficial em memória de Soleimani, de 62 anos.
O guia supremo iraniano, Ali Khamenei, e o presidente Hassan Rohani, que já nomearam Esmail Qaani para substituir Soleimani, também pediram represálias. Após o ataque, as forças pró-iranianas parecem mais fortes do que nunca no Iraque, país mergulhado há três meses em uma revolta popular contra o poder e a influência do Irã. O ataque americano "viola a soberania do Iraque", disseram os líderes iraquianos.
O líder xiita iraquiano Moqtada Sadr reativou sua milícia, chamada Exército Mehdi, que havia sido dissolvida após a luta contra a ocupação americana no Iraque (2003-2011). Por sua parte, Hadi Al Ameri, líder dos parlamentares pró-iranianos no Iraque, pediu união para "expulsar as tropas estrangeiras", referindo-se aos americanos.
Os deputados se reunirão no domingo (5) e poderão revogar o tratado entre o Iraque e os Estados Unidos, que permite a presença de 5.200 soldados americanos no país petrolífero. E nas grandes capitais, a preocupação domina. Moscou e Paris disseram estar preocupados com o risco de uma "piora da situação" no Oriente Médio.
Para Tóquio, "a perigosa operação militar americana (...) piorará a turbulência regional", enquanto a China exortou os Estados Unidos "a não abusar da força". "A perigosa operação militar americana viola as normas fundamentais das relações internacionais e agrava as tensões e turbulências regionais", disse o ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, a seu colega iraniano, de acordo com um comunicado publicado no site de seu ministério.
Por sua vez, a missão da Otan no Iraque, que treina as forças iraquianas, anunciou a suspensão de suas operações. E o chefe da diplomacia do Catar, Mohammed bin Abderrahmane Al-Thani, cujo país é próximo do Irã e abriga a maior base americana do Oriente Médio, viajou para Teerã.