Por necessidade financeira, os caminhoneiros brasileiros estão se arriscando ainda mais nas estradas do País. Levantamento da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra), a partir de estatísticas da Polícia Rodoviária Federal (PRF), aponta que as autuações por descumprimento da Lei do Descanso triplicaram no primeiro semestre de 2022.
O crescimento do excesso de jornada, inclusive, assusta: aumentou 218% nos seis primeiros meses do ano. Em 2022 foram 50.467 autuações, enquanto que de janeiro a junho de 2021 foram 15.825. Os dados reúnem apenas os casos registrados na rodovias federais (BRs).
Os flagrantes são resultado, aponta a Ammetra, da crise econômica enfrentada pelo País. Pesam, principalmente, os sucessivos aumentos no preço do diesel e a alta da inflação.
Confira a série de reportagens Mutilados - As verdadeiras vítimas do trânsito
Não é mais acidente de trânsito. Agora, a definição é outra nas ruas, avenidas e estradas do Brasil
“Em dois anos o diesel acumulou alta de quase 90%, em média. Sabemos que o gasto com combustível corresponde a até 35% dos custos com o transporte rodoviário de cargas no Brasil”, analisa o diretor científico da Ammetra, Alysson Coimbra.
“Para conseguir um rendimento mínimo, os caminhoneiros estão tendo que trabalhar muito mais e isso impacta não só a saúde da categoria, mas coloca em risco a integridade física de todos os demais usuários das vias que circulam”, alerta.
PERIGO GRANDE
Pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) revelou que há caminhoneiros que passam até 13 horas por dia ao volante, o que aumenta o risco de sinistros de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se diz. Entenda) nas estradas.
Alysson Coimbra lembra que o alto custo de manutenção dos caminhões também contribui para que os motoristas desrespeitem a Lei do Descanso. ”Os pneus são um dos insumos que mais oneram os motoristas, distribuídos entre os eixos dianteiro, truck e tração, possuem um rendimento de rodagem de 7.721km rodados, em média. Considerando que algumas composições como bitrem de 7 eixos, o custo total de substituição dos 26 pneus pode ultrapassar R$ 30 mil”, explica.
- Maio Amarelo: uso do celular ao volante é o novo álcool do trânsito
- Prisão perpétua para qualquer motorista que matar no trânsito, inclusive sob efeito de álcool e droga
- Álcool e direção: passageiro poderá ser punido por crime no trânsito envolvendo motorista embriagado
- CNH: é possível ensinar um filho sem habilitação a dirigir? O que diz o Código de Trânsito Brasileiro
IMPACTOS
O excesso de jornada também cobra um alto preço, lembra a Ammetra: o corpo não resiste ao excesso de trabalho e a saúde inevitavelmente é afetada. Estresse, falta de descanso, sedentarismo, solidão, os longos períodos sentado, e a alimentação irregular aumentam o risco de várias doenças fatais.
“O uso de estimulantes e substâncias psicoativas para evitar o sono, comprometem sentidos cruciais para uma direção segura, além de causar dependência e elevação contínua da dose para se obter efeitos cada vez menores”, diz Coimbra.
“Falhas humanas causam 90% dos sinistros de trânsito. E os sinistros envolvendo veículos pesados são potencialmente mais letais que os que envolvem apenas carros de passeio", afirma o especialista em Medicina do Tráfego.
Segundo Coimbra, a situação é extremamente preocupante, ainda mais com a recente aprovação de uma Medida Provisória do governo que, dentre outras deliberações, suspenderá a fiscalização de jornadas em alguns trechos de rodovias.
ENTENDA A LEI
A Lei do Descanso determina que o motorista pare de dirigir por 30 minutos a cada seis horas de trabalho. É proibido passar mais de cinco horas e meia ao volante sem interrupção.
No caso do transporte de passageiros, esse limite é reduzido para quatro horas. A lei também obriga que os motoristas tenham intervalos de 11 horas ininterruptas entre um dia e outro de trabalho.