Duas semanas após o furacão que eviscerou o departamento de futebol para todo o Brasil, o Sport parece enxergar um horizonte de céu espaçado e águas calmas. Os casos da não inscrição dos atletas contratados para a Série A e da suposta irregularidade do zagueiro Pedro Henrique, que se tornaram os maiores escândalos do Leão nos últimos anos, ainda fazem parte da realidade, mas as pessoas que lidam com esses problemas já não são mais as mesmas.
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A presidência mudou pela quinta vez em um ano, passando de Leonardo Lopes para Yuri Romão, e o futebol, após a destituição de Nelo Campos e demais diretores, encontrou uma nova liderança na semana passada. Augusto Carreras, advogado e ex-vereador do Recife, assumiu a vice-presidência da pasta na semana passada e vai para a terceira passagem na Ilha do Retiro.
"É sempre uma satisfação trabalhar no Sport. Estar ajudando o Sport é uma obrigação de todo rubro-negro. Isso pesou um bocado. É a terceira vez que passo pelo Sport, estive lá em 2009 e 2017. Estou voltando agora a convite de alguns amigos, que tenho excelente relação, e que são rubro-negros comprometidos com o Sport. Num primeiro momento fiquei um pouco reticente, até por ter outros projetos de vida, mas essa obrigação com o nosso clube, do desafio de poder ajudar num momento de dificuldade, acho que qualquer rubro-negro toparia e estaria ali para ajudar", disse Augusto.
"Isso que é importante, que a gente tenha essa tranquilidade de poder desenvolver aquilo que o clube precisa para sair dessa dificuldade. Eu quero dar minha parcela de contribuição, vou trabalhar e fazer o que for preciso dentro desses dois meses para que a gente tenha resultados positivos. Sou uma peça a mais nessa engrenagem e estou chegando agora. Ninguém está chegando aqui como salvador da pátria", completou Carreras, que recebeu a reportagem da Rádio Jornal em seu apartamento na Zona Norte do Recife.
Augusto flertou com uma volta ao cenário do Sport ainda na temporada passada. Durante o conturbado processo eleitoral, recebeu convite para se candidatar à presidência, mas acabou recusando. Aliás, após dois pleitos numa só temporada, o dirigente leonino enxerga o clube travado por uma grande divergência política nos bastidores, algo que não pretende cultivar enquanto estiver no cotidiano da Ilha do Retiro.
"Todo processo de eleição trava o clube. Você não sabe quem vai assumir o clube. Avalie você ter no mesmo ano várias eleições. São várias travas e incertezas. No fim do ano passado eu fui convidado a disputar a eleição para presidente, que estava marcada para dezembro, mas outros compromissos que tinha me impediram de concorrer", comentou o dirigente.
"Naquele momento eu me afastei do processo eleitoral. Não tinha condições de colaborar e por isso me afastei. Nos últimos anos o Sport vem esticando demais essa corda, essa divisão. Que você tenha eleições e disputas, isso faz parte da democracia e do processo natural de qualquer organização no Brasil, isso é natural. Agora o que tem que acabar é essa disputa pós-eleição", acrescentou Augusto.
Os contatos voltaram a acontecer após as recentes crises que chacoalharam o ambiente do clube. De início, ainda com Leonardo Lopes na cadeira de presidente, Augusto recebeu um primeiro convite que acabou não sendo aceito. O segundo veio na semana passada, feito de forma direta pelo presidente em exercício, Yuri Romão.
"Na realidade não houve exigência. Desde a primeira vez que fomos convidados e sondados, estávamos discutindo outros projetos de vida. Mas a obrigação como torcedor do Sport falou mais alto. Quando fomos convidados pela segunda vez, já pelo presidente Yuri, houve uma discussão mais demorada no sentido de detalhar a situação financeira, do departamento, o que ele imaginava de planejamento para o fim do ano e do ano que vem, para ver se essas ideias entravam na mesma página", afirmou Augusto.
Mesmo assim, uma das mudanças que ele pretende implementar e discutir com a gestão agora a frente do futebol leonino passa pela revisão do acordo de pagamento de 70% do salário dos atletas.
"Lógico que se a gente conseguir receitas extras que nos permitam sentar e reestabelecer uma vantagem melhor para os atletas, vamos fazer, mas a gente pretende continuar honrando os acordos. Se tivermos capacidade de pagar o 100%, não tem para que não pagarmos. Até por diminuir aquilo que teríamos de pagar lá na frente. É obrigação de qualquer contratante honrar com 100% daquilo que foi pactuado quando da feitura dos contratos de cada jogador, é isso que a gente quer fazer. A gente está tentando buscar recursos extras e aportes financeiros para que possamos honrar com 100% do que o jogador acordou quando chegou ao clube", comentou Augusto.
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As obrigações de Augusto Carreras passarão também por uma completa reestruturação do departamento de futebol. Além dos funcionários da casa e staff, ele está acompanhado de Antônio Santos, como gerente, e Gilberto Lima, como supervisor. Com esse cenário de esvaziamento, há um plano para o restante da atual temporada e outro para o começo do ano que vem, todos eles envolvem um organograma mais enxuto. Atualmente, a prioridade é a procura por um executivo de futebol, cargo que também passou por várias mudanças desde o começo da temporada.
"Nós estamos procurando um executivo com autonomia. Não adianta profissionalizar o departamento e ficar só no discurso, tem que ter autonomia. Agora, a gente vai ter autonomia trabalhando com metas. Todo o profissional do departamento de futebol vai ter metas a atingir, isso que a gente vai cobrar. Precisamos que ajude no planejamento do perfil de equipe, no financeiro, que tenha network e relação com os outros clubes, tanto para buscar jogadores e para proporcionar intercâmbio de jogadores. Precisamos de um executivo que saiba cobrar e gerenciar, que saiba dialogar com o departamento de futebol na burocracia e que saiba dialogar com o elenco e comissão técnica dentro de campo. É esse perfil que estamos procurando", trouxe Augusto.
Já entre as heranças do cargo, a do caso Pedro Henrique é o fantasma que mais assombra. No momento da entrevista, o STJD ainda não havia confirmado a Notícia de Infração contra o Sport feita por outros nove clubes da Série A, mas Augusto já demonstrou confiança na defesa do Leão.
"Uma possível punição assusta muito. O Sport tem a tranquilidade que fez a coisa certa e que está se organizando para o que possa vir a acontecer. Temos banca de advocacia contratada, temos um departamento jurídico de muita competência através do Rodrigo Guedes, que tem acompanhado isso com muito zelo e cautela. Temos o Osvaldo Sestário que sempre acompanhou os clubes do Brasil e com muita experiência na CBF. Se for preciso reforçar essa banca de advocacia nós vamos reforçar, já que nosso direito é muito bom", declarou Carreras.
"Sabíamos que essa repercussão ia aumentar a partir do momento que o Sport voltasse a demonstrar força dentro do campeonato. Ninguém queria mexer com o Sport achando que o Sport era pato morte, quando viram a reação a conversa mudou. Não nos causa nenhuma surpresa essa mobilização dos clubes. O Sport está tranquilo em relação a isso e precavido. O que vier a acontecer nós estaremos prontos", completou.
CONFIRA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA
DIREÇÃO DE FUTEBOL
“Na realidade, com tudo que aconteceu e foi amplamente noticiado, o presidente tomou uma decisão em conjunto com os outros membros do departamento de futebol de fazer algumas mudanças, desde a vice-presidência até os diretores e o executivo. É um departamento que hoje se encontra muito esvaziado. A gente assumiu com a missão de reestruturar. Tivemos a volta do Gilberto Lima, que esteve no clube durante anos e podemos dizer que é um profissional da base do clube, foi formado pelo clube durante anos e teve um grande professor que foi o Coronel Adelson Wanderley. Ele está de volta nessa parte burocrática de logística e vigem, de registro de jogador, embora não tenha mais jogador para registrar, mas ele sempre tratou isso com muito zelo e atenção. Tivemos também a colocação do Antônio Santos, que também é um profissional que está dedicado ao departamento de futebol. Espero ao longo desses dias estar trazendo um diretor executivo e mais gente, não podemos ficar somente no diretor executivo. Esse departamento precisa ser reestruturado, está vazio hoje. Estamos com cautela e zelo, pesquisando e ouvindo muita gente para que possamos trazer um executivo que venha nos ajudar nos últimos dias do ano e na montagem do planejamento de reestruturação do departamento. Não é só pensando no próximo time ou competição, é pensando nisso primeiro e daí iniciar o planejamento de 2022 em qualquer que seja o cenário. O Sport não pode esperar o final do ano para iniciar esse planejamento do ano que vem. Por enquanto é assim que vamos terminar o Brasileirão, são dois meses. A ideia é trabalhar de forma bem enxuta, então ficaria sozinho como estatutário e trabalharia com um gerente e um executivo. Isso não impede que possamos planejar como fica o departamento no ano que vem, inclusive com outras pessoas que venham a se agregar nesse departamento. Mas a princípio do jeito que foi planejado, com um VP, um executivo e um gerente de futebol”.
RELAÇÃO COM O ELENCO
“A gente conhece alguns atletas. Maílson, Sander, Everton Felipe e Ronaldo, atletas que trabalharam com a gente em 2017. Eu posso falar para você o que vi de quarta-feira (6) para cá. Eu vi um elenco comprometido com o clube, com a comissão técnica, um elenco que sabe o comprometimento é recíproco com o treinador. Me surpreendeu o fechamento que eles tiveram com o Florentin, isso é muito bom. O ambiente que vi no vestiário é o ambiente ideal para dar sequência positiva que se iniciou contra o Grêmio”.
TRABALHO E FUTURO DE FLORENTÍN
“É um treinador de muito diálogo. Conversa com a direção e elenco, todas as decisões tomadas são conversadas com o elenco. Embora ele seja um treinador disciplinador, o que ele tem de disciplinador ele tem de democrático nas tomadas de decisões. Isso é importante e fortalece o grupo, traz para dentro do que a comissão técnica espera. Acho que o Florentin começa a encontrar o seu time, colocar dentro do elenco aquilo que ele pensa de um jogo de futebol, e olhe que ele não conseguiu ainda repetir a escalação. Quando você contrata um treinador, você não contrata pensando em demiti-lo. Você contrata pensando em resultados e pensando que ele possa desenvolver o trabalho dele. O que todo clube quer é resultado positivo e se você tem um treinador que traz resultados positivos, você quer que ele fique por vários anos. Florentin está desempenhando o trabalho dele, que está sendo avaliado. Ele é o treinador que o Sport tem e é o treinador do Sport Club do Recife”.
AGUIRRE, VANDER E SAULO
“A gente sente por não poder usar esses atletas. Foram atletas que foram contratados para jogar, com disposição de jogar e deixaram as suas famílias. O exemplo do Aguirre, que deixou a esposa com um filho recém-nascido, mas chegamos num entendimento financeiro com ele, não é mais atleta do Sport. Temos uma dificuldade hoje que todas as janelas estão fechadas. A ideia nossa é fazer um acordo amigável. São atletas que podem não reunir condições legais para jogar esse ano, mas que podem se encaixar dentro um planejamento para o ano que vem, isso a gente está discutindo. Se eles têm condições de jogar pelo Sport e estão aqui se adaptando a cidade e ao clube, é mais fácil você contratá-lo por já conhecer o perfil do atleta. Antes você conhecia por consultas, imagens e indicação, agora estamos conhecendo dentro de caso. Temos o caso do Saulo e do Vander para analisar. O Aguirre já é um atleta desligado”.
CATEGORIA DE BASE
“Existe um jargão no futebol que é verdadeiro: ‘o clube está atento ao mercado’, tanto para contratar como para vender. Não tem jogador na prateleira, nem em anúncio para ser vendido. O que a gente precisa saber é que existe o timing para negociação. Nenhum clube do futebol brasileiro hoje consegue fechar o ano no azul se não tiver uma negociação de atleta. A receita que o clube consegue através de bilheteria, inclusive com muita dificuldade esse ano pois só agora que reabriram as bilheterias e mesmo assim não paga o custo operacional, patrocínios, televisionamento, essas receitas não são suficientes para se montar um time de alta competitividade. É preciso fazer outras receitas, como a de negociação de jogador, aqueles que geralmente o clube detém os direitos, os da base. Não estamos colocando nenhum jogador para vender, não temos interesse nenhum em vender. Eles estão se consolidando, vão valorizar no mercado e vão nos ajudar muito. Agora, uma boa proposta ninguém nega. Sendo boa para o clube e atleta, sentamos e negociamos. Não há ninguém à venda”.