A projeção do diretor de fotografia Pedro Sotero

Ele está com três trabalhos simultâneos no Brasil e em festivais internacionais, como os longas Bacurau e Vermelho Sol e o curta Swinguerra
Ernesto Barros
Publicado em 20/08/2019 às 12:39
Ele está com três trabalhos simultâneos no Brasil e em festivais internacionais, como os longas Bacurau e Vermelho Sol e o curta Swinguerra Foto: Nicolau Saldanha/Divulgação


Nos últimos 10 anos, o audiovisual pernambucano não foi apenas campeão de filmes premiados nos festivais nacionais e internacionais de cinema. Além dos filmes e dos seus diretores, vários outros profissionais da área – da direção de arte, do figurino e da montagem, entre outros – ganharam projeção nacional e internacional. Um dos nomes mais reconhecidos é o diretor de fotografia Pedro Sotero. Atualmente, três filmes em que Pedro esteve envolvido estão circulam pelo mundo, como os longas Bacurau, de Kleber Mendonça Filho, e Vermelho Sol, do argentino Benjamin Naishtat, e o curta-metragem Swinguerra, de Bárbara Wágner e Benjamin De Burca. Nesta entrevista, Pedro Sotero fala do começo da carreira no Recife, juntos com outros colegas de geração, e das parceiras com cineastas brasileiros e estrangeiros.   

 JORNAL DO COMMERCIO – Como teve início sua carreira de diretor de fotografia?

PEDRO SOTERO – Surgiu primeiro, obviamente, de um desejo de trabalhar com cinema e entender que era possível trabalhar com cinema no Recife. Meu primeiro contato com essa possibilidade foi num curso que Kleber deu no Cinema da Fundação, chamado Olhar Crítico. Eu era estudante de agronomia e tinha interesse por imagem. E lá conheci alguns realizadores daqui, como Daniel Bandeira, e aprofundei minha amizade com Kleber, que eu conhecia com crítico e curador do Cinema da Fundação. A gente começou a ficar amigo e comecei a trabalhar como assistente de produção. Logo depois do curso, o primeiro filme que fiz foi The Last Note, de Léo Falcão, como estagiário de produção. Em 2003, ainda procurava em qual área do cinema iria trabalhar, quando João Jr. me convidou para ser estagiário de fotografia em Cinema, Asprinas e Urubus, de Marcelo Gomes, que foi meu primeiro contato com a equipe de câmera, com equipamento de cinema. Foram oito semanas de filmagens e conheci Mauro Pinheiro Jr, que era o diretor de fotografia do filme, e me dei muito bem com ele. Foi ali que me encontrei e me joguei de cabeça para investir na minha carreira no cinema. Foi nessa mesma época que conheci Juliano Dornelles, estagiário de direção de arte; Gabriel Mascaro, estagiário de direção, e Daniel Aragão, terceiro assistente de direção. João Jr. deu essa oportunidade pra gente e nunca mais largamos o osso do cinema.

JC – Depois veio Amigos de Risco, de Daniel Bandeira, o primeiro longa-metragem de sua geração. Como você entrou no filme?

SOTERO – Mauro me convidou para ser assistente dele e fui para o Rio, onde passei uns quatro anos. Num das voltas ao Recife, Daniel Bandeira me falou que um tinha roteiro de curta-metragem, chamado Amigos de Risco, e que tinha uma grana para realizar. Quando ele apresentou esse roteiro para mim, para Gabriel e para Juliano, a gente convenceu Daniel de que poderia ser um longa-metragem, que a gente ia fazer com dinheiro de curta, não importasse o que a gente tivesse que fazer. Bandeira escreveu um roteiro de longa e foi isso, fizemos o filme com esse desejo e essa pulsão de jovens que queriam fazer cinema. E Kleber estava ali também, sempre conversando com a gente. Eu gosto demais desse filme. Acho que o Recife nunca havia sido retratado daquela forma, tão escuro, tão violento e tão vazio.

JC – E como começou sua parceria com Kleber Mendonça Filho?

SOTERO – Eu já tinha feito assistência de direção dele em outros projetos e fui ator em Noite de Sexta Manhã de Sábado. Ele me convidou e aceitei por pura amizade. Kleber gosta de trabalhar com pessoas próximas. Fizemos primeiro Recife Frio e ele me convidou para fazer O Som ao Redor, em 2010. Eu ainda estava em início de carreira, ele poderia ter escolhido outro, mais experiente, mas assim mesmo me chamou. Mas, eu pedi para ele chamar também Fabricio Tadeu, que era meu amigo e mais experiente, trabalhei no Rio e com quem desenvolvi um diálogo grande sobre fotografia. Ele também estava começando a fotografar, mas era um operador de câmera muito experiente, já tinha feito Cidade de Deus e O Quatrilho. Como deu muito certo e a gente tinha uma grande afinidade estética, Kleber estendeu o convite para Aquarius, alguns anos depois. Fabrício também convidado para fazer Bacurau, mas ele estava envolvido num trabalho longo na Globo e não teve como vir. Por isso, decidi não dividir a direção de fotografia e me senti seguro o suficiente para fazer Bacurau sozinho.

OUTRAS PARCERIAS

JC – A partir da parceira com Kleber você estabeleceu outras parcerias duradouras, entre elas a com Fellipe Barbosa. Como vocês se conheceram? .

SOTERO – Conheci Fellipe no Festival de Santa Maria de Feira, em Portugal, e iniciamos uma amizade. Teve um momento que decidi fazer um curso de fotografia avançada na Universidade de Nova York. Eu sabia que ele estava lá e havíamos combinado de nos encontrar, mas nos esbarramos no Soho, por acaso. Ele estava voltando para o Brasil e estava querendo fazer um documentário sobre uma personagem que havia conhecido. Fizemos o documentário Laura só nós dois, com câmeras DSLR, que também filmavam. Depois de um mês, ele voltou ao Brasil e conseguiu uma grana do DocTV. Um ano depois, voltamos para concluir as filmagens. Tempos depois ele me convidou para fazer Casa Grande, no Rio, e depois surgiu o convite para fazer Gabriel e a Montanha, quando filmamos na África.

JC – Em menos de um mês três filmes em que você trabalhou explodiram nas telas do mundo inteiro. Além de Bacurau, que estreia semana, você fez o curta Swinguerra, de Barbara Wagner e Benjamin de Burca, convidado para o Festival de Locarno e a Bienal de Veneza. E tem o longa Vermelho Sol, do argentino Benjamim Naishtat, ainda em cartaz. Como surgiu este projeto para você, que acabou lhe dando o prêmio de Melhor Direção de Fotografia em San Sebástian?

SOTERO – Foi graças às politicas públicas de coprodução do Brasil, no caso com a Argentina. Por isso, têm que ter técnicos brasileiros na realização e finalização. Benjamim ventilou a possibilidade de ter um diretor de fotografia brasileiro. Ele gostava muito de Casa Grande e de O Som ao Redor, que eu acho que é um filme irmão de Bem Perto de Buenos Aires (Histórias del Miedo, no original), o primeiro longa dele. São filmes que tem a temática desse medo invisível do social, que surgiram em tempos muito recentes. Ele viu os filmes que eu fiz e entendeu que tinha uma identificação. Mandou o roteiro, muito bem escrito, de um filme policial de época, um thriller de lenta combustão e inspirado num tipo de cinema que já venho pesquisando há muito tempo. De uma forma assustadora, eu vejo algum paralelo do filme com o Brasil, com esse ataque que a cultura, a tecnologia e a educação vêm sofrendo.

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