O Metrô do Recife já foi uma referência nacional. Era o mais limpo, o mais moderno e se orgulhava de não ter nenhuma pichação nos seus 25 vagões de aço inoxidável.
É uma situação bem diferente de hoje, quando o Metrô está completamente sucateado, embora quando em funcionamento transporte até 450 mil passageiros por dia.
Em 2014, por ocasião da Copa do Mundo, o governo federal comprou mais 15 vagões mais modernos, que hoje servem a linha Centro (que é a mais procurada e transporta até 250 mil passageiros por dia). Mas hoje a CBTU administra um conjunto de estações e um sistema com o que sobrou do Metrô que muita gente tem na memória, com estações limpas e trens funcionando no horário.
A expressão "o que sobrou" pode ser dura, mas se ele funciona hoje é por absoluta dedicação dos funcionários em colocá-lo nos trilhos.
E o que vem acontecendo - como a parada de ontem e hoje - o Metrô parou de novo porque o equipamento já era. A questão é quem se propõe a bancar a conta.
O Metrô do Recife, junto com o de Belo Horizonte e mais os trens de Maceió, João Pessoa e Natal, fazem parte de um pacote de sistemas de trens urbanos que estão na lista da privatização, cujo escopo do edital está sendo feito pelo BNDES.
E, embora como informou o BNDES, os estudos ainda estejam sendo feitos, já se sabe o quadro que um eventual interessado no Metrorec terá: um cenário dramático, não apenas porque o equipamento está sucateado, assim como o modelo de negócio como está estruturado não se sustenta.
Uma coisa parece certa. O Governo tem que continuar a botar dinheiro do contribuinte, embora um investidor possa ser chamado a gerenciar o que sobrou do Metrô do Recife.
E o quadro que a consultoria deve entregar pode ser antecipado com uma leitura do boletim de “Empresas Estatais Federais Dependentes do Tesouro Nacional”. Ele está disponível no site do Ministério da Economia.
Quem for lá vai ver que a CBTU, que controla o Metrô do Recife, consumiu em 2019, 3,0% do que a União pôs nessas empresas (Existe uma outra empresa com suas características, a Trensurb de Porto Alegre ficou com 0,7%).
A CBTU tem uma dependência de 77,1% da União e sua geração de receita é de 1 para cada cinco que necessita.
E como é uma empresa que ficou velha, os seus custos médios por empregado, de R$ 7 mil, embora esteja longe de ser o mais caro, pesa muito.
Mas o que assustará o investidor é o passivo trabalhista estimado em R$ 3,3 bilhões, com 90% das ações judiciais prováveis para os ex-empregados. Como o Metrô do Recife é o maior sistema da CBTU, estima-se que essa conta na Justiça do Trabalho fique perto de R$ 1,2 bilhão.
Isso quer dizer que qualquer empresa que comprar o Metrô do Recife e os demais sistemas deve saber que na conta tem mais R$ 3,3 bilhões.
Nesta segunda-feira, o Jornal do Commercio, através da jornalista Roberta Soares, divulgou que os primeiros números do BNDES estimam que ele precisaria de ao menos R$ 1 bilhão para voltar a funcionar com alguma qualidade.
Conforme apurou Soares, o valor será investido na recuperação de toda rede aérea do sistema (que faz a alimentação do metrô), incluindo as linhas elétricas - Centro (com seus dois ramais: Camaragibe e Jaboatão) e Sul - e a diesel (VLT), do material rodante (todos os veículos que trafegam sobre os trilhos de uma ferrovia - trens de passageiros e de manutenção), dos trilhos e dormentes, além da reforma das estações.
Outro ponto importante é que, dos cinco sistemas sob gestão da CBTU e que estão sendo alvo dos estudos de transferência para a gestão privada, o do Recife e o de Belo Horizonte (MG) são os que mais têm capacidade de atrair investidores. Existe uma dúvida se a CBTU venderia os sistemas separados.
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Quando se observa o relatório do Ministério da Economia, pode se ver que comprar a CBTU vai exigir capacidade de investimentos.
A questão das receitas é o ponto central. A receita da CBTU dependente da União caiu de 85,7% para 77,1%. Isso tem a ver com as tarifas.
Por motivos políticos, a CBTU passou cinco anos sem reajustar suas tarifas somente no ano passado, por determinação da Justiça Federal de Minas Gerais. O problema é que para corrigir os preços, a passagem foi de R$ 1,60 para 4,60 em março último.
Essa situação fez com que as despesas da CBTU ficassem divididas em 48% de pessoas e 52% com as demais receitas. Isso quer dizer que uma transferência para o setor privado tem que contemplar a questão das tarifas. E, é claro, prever dinheiro do Governo Federal ou estadual.
E aí vem o problema. Os estados estariam dispostos a botar dinheiro no Metrô?
O Governo de Pernambuco informa que por não já gasta R$ 600 milhões com redução de ICMS e transferência de recursos via compra de passagens para estudantes e outras categorias. Com as dificuldades, não existe garantia que coloque mais dinheiro.
Mas tem uma coisa muito importante. O Metrô do Recife virou estratégico. Ele tem enorme potencial de ser ampliado para outras regiões e chegar a Suape e Olinda e região oeste, chegando à Cidade Universitária.
A questão é se existem empresas interessadas nesse equipamento. E quais as condições em que estariam dispostas a assumir esse sistema. Sabendo que apenas com o valor da passagem não existe metrô que se sustente.
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