Em 2018 o FBI prendeu um traficante internacional. Em uma das conversas com o criminoso, ele fez uma proposta surpreendente para a polícia americana. Se reduzissem sua pena, ele poderia dar acesso a um app de mensagens usado por criminosos no mundo inteiro.
Uma das atividades do traficante era o desenvolvimento de um novo dispositivo, chamado ANoM, que seria vendido como um telefone celular modificado, sem qualquer sinal que pudesse ser hackeado, e equipado com um software de criptografia personalizado que o tornaria mais seguro do que qualquer outro dispositivo no mercado.
A proposta era tentadora. Poder se comunicar livremente sem ser monitorado pela polícia é um dos grandes desafios dos marginais. O dispositivo se tornou um sucesso no mundo do crime.
Os criminosos nem imaginavam que o FBI era o verdadeiro dono do sistema de mensagens. Assim, cada telefone vendido com o sistema saia com uma backdoor (um acesso escondido que permitia monitorar e gravar todas as mensagen). E os bandidos, acreditando que estavam seguros com o aparelho, seguiram suas atividades normalmente.
De acordo com declarações públicas, o FBI e outras agências espalharam telefones ANoM para sindicatos suspeitos de crimes, construindo gradualmente uma rede de cerca de 12.000 aparelhos no total (e 9.000 ativos). Os telefones secretamente desviaram 27 milhões de mensagens entre 2019 e 2021, resultando na Operação Greenlight / Trojan Shield - uma apreensão em grande escala que incluiu a apreensão de cerca de oito toneladas de cocaína, 22 toneladas de cannabis e resina de cannabis, 250 armas de fogo e R$ 250 milhões em dinheiro e criptomoedas.
Em três anos, o ANoM foi usado em 90 países. Mais de 800 criminosos foram presos.
A ação do FBI vai muito além dos dados colhidos e criminosos presos. Agora, mesmo os criminosos mais sofisticados que compram aparelhos especiais e usam aplicativos de mensagens criptografados deveriam se sentir inseguros ao se comunicarem digitalmente, o que deve dificultar os negócios.
Lição de segurança digital
Uma das razões dos criminosos se sentirem tão seguros com o sistema de mensagens é que ele parecia ser criptografado. Isso de fato aumenta muito a segurança das comunicações digitais, visto que é extremamente difícil interceptar e quebrar mensagens quando o código é criptografado. O problema é que como o sistema foi construído com uma falha (a backdoor instalada pelo FBI), não era criptografado e a polícia conseguia facilmente monitorar tudo.
Isso significa que o seu WhatsApp (que é criptografado) e outros dispositivos de mensagens não são seguros? Não, de maneira geral eles são seguros. Como todo software eles podem ter falhas e serem invadidos, mas isso é mais explorado por governos e alvos altamente sofisticados.
Para o cidadão comum, o problema é que muitas pessoas ainda compram aparelhos de origem duvidosa ou instalam aplicativos obscuros no smartphone. E assim como no caso do sistema do FBI, esses aparelhos podem vir com desagradáveis surpresas.
À medida que usamos telefones e apps de mensagens para fazer virtualmente tudo, torna- se ainda mais importante preservar a segurança dos dispositivos e aplicativos nele instalados.
Alguns cuidados podem ajudar a evitar maiores riscos:
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Compre seu celular de fornecedores autorizados e reconhecidos no mercado
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Cheque se o aparelho tem o selo da Anatel e se a caixa ainda está lacrada
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Desconfie de ofertas tentadoras demais
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Não baixe aplicativos fora da loja oficial da Apple e do Android
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Cuidado com aplicativos que você encontra clicando em anúncios ou ofertas tentadoras demais
Na dúvida, não compre o aparelho ou não baixe o aplicativo. Como os bandidos que usavam o ANoM descobriram, quando a promessa parece ser boa demais para ser verdade, provavelmente é mentira. E as consequências podem ser desastrosas.