O passageiro dos ônibus da Região Metropolitana do Recife quer, mais do que tudo, fazer viagens rápidas e pagar uma passagem barata. Ou, ao menos, que tenha um valor acessível, que consiga financiar. Esse é o principal resultado de um estudo realizado sobre o Sistema de Transporte Público de Passageiros da RMR (STPP), que responde pelo deslocamento urbano da grande maioria da população nas 14 cidades da RMR. Embora as conclusões não sejam nenhuma novidade para quem vivencia as dificuldades e o abandono do transporte público coletivo brasileiro, o estudo escancara a urgência de medidas práticas e imediatas para evitar o comprometimento do serviço regular.
Conheça as Faixas Azuis Metropolitanas, uma solução para os ônibus do Grande Recife
O estudo fez uma relação direta entre causas e efeitos da falta de prioridade operacional e política do transporte público no Grande Recife. Identificou, por exemplo, as variáveis que influenciam a escolha das pessoas pela utilização do modal e como elas pesam sobre a demanda. De forma geral, concluiu que são o tempo de viagem e o valor da passagem que mais pesam. Para se ter ideia, para cada aumento do tempo médio de viagem de 1%, a demanda cai em 0,43%. E, no caso da tarifa, cada elevação do valor na ordem de 10%, por exemplo, reduz a demanda de passageiros entre quase 4% e 6%. Ou seja, os ônibus da RMR - assim como de todo o País - precisam ter prioridade viária nas ruas (leia-se faixas exclusivas para circular) e uma tarifa subsidiada pelo poder público.
“Precisamos de duas tarifas, essa é a grande discussão. Uma cobrada do passageiro e outra paga ao operador. A primeira num valor acessível, que promova a inclusão social. E a segunda sendo uma tarifa subsidiada pelo poder público. Não é possível mais que o passageiro pague sozinho pelo custo da operação”, alerta Oswaldo Lima Neto, professor e pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que realizou o estudo junto com os também pesquisadores da instituição Maurício Andrade e Lígia Rabay. O estudo começou a ser feito ainda antes da pandemia de covid-19 e foi contratado pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE).
Oswaldo Lima Neto, que é referência em transporte coletivo urbano no Estado e no País destaca que essa mudança só acontecerá quando o modelo de financiamento do setor de transporte for revisto. “Esse subsídio pode e deve ser com recursos públicos, mas principalmente proveniente de receitas extra tarifárias. É o caso da destinação da arrecadação do IPVA e dos estacionamentos rotativos, por exemplo. Com um financiamento extra tarifário é possível, por exemplo, reduzir na metade a tarifa do passageiro e cobrir a diferença com essas fontes”, explica.
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Foram analisados dados sobre o transporte público e a evolução do uso e ocupação do solo na RMR entre 2007 e 2018, como por exemplo a quantidade de passageiros transportados, o índice de cumprimento de viagens, o tempo médio de viagem, a taxa de desemprego, a densidade demográfica, a frota, a quantidade de empresas registradas de todos os setores econômicos na RMR, entre outros. “É preciso fazer algo e logo, sob risco de perdermos o transporte público coletivo regular. Como não vemos ações serem praticadas, está havendo uma degradação gradativa do sistema. O poder público estabelece um contrato com o operador, mas não o fiscaliza. Resultado: sem recursos, o operador reduz o serviço, que significa tirar ônibus. Na prática, quem comanda o sistema é mesmo o operador”, afirma.
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AÇÕES PRÁTICAS
Os pesquisadores concluíram no estudo que, por mais que existam problemas estruturais que afetam os usuários e extrapolam a capacidade de intervenção do poder público municipal e estadual, como desemprego e redução de renda, a solução dos problemas mais relevantes depende de ações e políticas públicas de âmbito local. É o caso da destinação de recursos para criar fontes extra tarifárias e a ampliação das faixas exclusivas nas ruas, que no Recife são chamadas de Faixas Azuis.
O Recife, por exemplo, é a cidade da RMR que mais tem faixas exclusivas. São 65 quilômetros, dos quais 45 foram executados em oito anos de gestão do PSB. Mas, apesar dos avanços, ainda é muito pouco quando consideramos o total de vias por onde circulam os coletivos. Jaboatão dos Guararapes tem um único equipamento (na Avenida Ayrton Senna) e Olinda outro (Avenida Presidente Kennedy), planejando implantar outro em breve.
Confira o estudo na íntegra:
Relato?rio Fatores Influentes na Queda da Demanda by Roberta Soares on Scribd